Transcrição do Sermão do Padre Rafael Scolaro realizado em 12/01/2020 na Capela Nossa Senhora da Glória (Curitiba – PR) em função da Missa da Sagrada Família. Ao final do texto,também está presente o vídeo da homilia.
Amados filhos, reverendo diácono,
Estamos hoje celebrando a Sagrada Família no nosso calendário tradicional. É interessante, amados filhos, percebermos as palavras de Nossa Senhora, que na verdade se traduz assim: “eis que o teu pai e eu te procurávamos com dor”, dolentes.
É interessante, meus queridos, olhar hoje para a família, mas de forma especial olha para a Sagrada Família. Sem dúvida alguma, sabemos que Nossa Senhora é a mãe de Nosso Senhor, de quem Ele recebeu a sua humanidade. E São José, meus queridos? Foi mais do que simplesmente um pai adotivo.
Claro que ele não foi pai de Nosso Senhor na carne, mas foi sim seu pai legítimo, pois Jesus foi concebido dentro deste casamento por ação do Espírito Santo. É, portanto, com propriedade que Nossa Senhora disse: “eis que teu pai eu te procurávamos com dor”, com grande dor.
Como vimos no evangelho hoje, Jesus, com 12 anos, havia se perdido dos seus pais, havia ficado em Jerusalém depois dos festejos da páscoa. Assim, Nossa Senhora nos ensina, juntamente com São José, que quando nossa família fica sem Nosso Senhor, quando nos perdemos dele, quando ele fica no caminho, o que nos resta é dor. Então precisamos buscá-Lo.
Nós vivemos um tempo, meus amados, onde nós fugimos da dor, mas vocês sabem, meus filhos, que a dor é um caminho que nos leva também até Deus. Infelizmente, o caminho da dor é um caminho trilhado pela maioria das pessoas que voltam a Nosso Senhor; poucos voltam pelo amor. Muitos descobrem o amor depois da dor, mas a dor é preciosa.
Nós fugimos da dor, fugimos do sacrifício. Há seitas que gritam no nosso tempo: ‘deixe de sofrer’, e assim nos esquecemos da via sacra, nos esquecemos da paixão, nos esquecemos do valor do sacrifício. Porém, amados filhos, o verdadeiro amor é provado no fogo.
O verdadeiro ouro é provado no fogo. Da mesma forma, é no sofrimento e na dor que provamos que existe um verdadeiro amor.
Este amor, meus queridos, que é a base de toda e qualquer família digna, decente, cristã. Por isso não devemos reclamar dos sofrimentos, mas lembrar que os sofrimentos são muitas vezes, meus queridos, a nossa chance de salvação.
Muitas vezes é aquela cruz que nós precisamos para nos aproximar mais de Deus. Assim, nas dificuldades que a família passa, meus queridos, é no sofrimento que devem se unir mais, e não dividir.
Se ocorrer de uma família se dividir no sofrimento, significa que tinha ali plantado não o amor, mas o egoísmo, porque quando alguém que nós amamos sofre, nós queremos com esta pessoa carregar a cruz. E a família, meus queridos, foi assim querida e abençoada por Deus: como o primeiro lugar da nossa santificação. Como é bonita e grandiosa a família! Como é abençoada a família. Deus vindo ao mundo quis nascer em uma família, por isso chamava, com propriedade, a Santíssima Virgem de mãe e chamava a São José, que o criou no amor, de seu pai.
É com São José que Nosso Senhor trabalhava. Nós vimos no Evangelho que ele crescia em estatura, em idade, em graça diante de Deus e dos homens. Em ciência, a família tem essa missão, meus queridos, de formar os cristãos em primeiro lugar; de formar os cidadãos, de formar a nossa sociedade. Se quisermos destruir a sociedade, pois então que destruamos a família, pois ela é composta de sociedades.
O que nós vemos nos nossos tempos, amados filhos, é uma sociedade corrupta, colapsada por todo tipo de mal moral, indecências. O que acontece quando olhamos para a família? Encontramos as mesmas situações. É urgente, amados filhos, que nós voltemos a nos espelhar na Sagrada Família. É urgente, amados filhos, que entendamos o significado de uma verdadeira família, por isso me permitam falar um pouco sobre esta família.
Nós somos pequenos para falar de uma família tão grandiosa, uma vez que falamos da família de Nosso Senhor, mas foi esta família que Ele quis que fosse nosso modelo, que fosse nosso exemplo. São José, como é grande São José, amados filhos! Ele foi o homem escolhido por Deus para ser o seu pai nessa terra. Quem é São José? Se nós pararmos para meditar um pouco, nós veremos a grandeza deste santo que criou Nosso Senhor, que pôde segurar o menino Jesus em seus braços, que pôde acompanhar o menino Jesus. É um homem digno e decente: a sagrada escritura diz que ele é justo e isso quer dizer que ele é santo.
São José, meus queridos, que nunca duvidou de Nossa Senhora. Em relação à anunciação, São José sentiu um medo. São José sentiu medo, não por duvidar da Virgem, porque se não ele a teria denunciado, mas porque ele sabia que ela era Santíssima e que aquilo que acontecia era obra de Deus. É impossível que fosse dos homens, por isso ele fugiu em segredo.
Ele fugiu em segredo, porque São José nunca duvidou da pureza de Nossa Senhora; ele fugiu em segredo, porque sabia que Deus estava colocando o seu dedo ali; ele fugiu em segredo, porque amava de verdade. Assim, meus queridos, quando avisado em sonho para que não tivesse medo – ‘não tenha medo porque é obra de Deus’ – e percebendo que tinha sido escolhido para essa missão, São José assume e passa muitas dificuldades.
Estamos no tempo da epifania dentro do nosso calendário tradicional, tempo em que celebramos a visita dos magos. Por isso ainda estamos meditando os mistérios do Natal. Então pensem vocês, meus queridos, o que foi para São José ter que sair de sua terra de Nazaré, com Nossa Senhora grávida de nove meses, no lombo de um jumento, para cumprir a lei, viajando muito, subindo as montanhas, para que lá cumprisse o tempo. O menino vai nascer e São José sabe da sua responsabilidade. Ele procura em todas as casas um lar que abra suas portas, mas, como hoje em nossos tempos, todos estavam muito ocupados para abrir a sua casa para o menino Jesus. Nosso Senhor teve que nascer numa estrebaria, entre os animais.
São José era carpinteiro. Imaginem vocês uma obra feita por São José! Com certeza lá em Nazaré havia ficado um lindo bercinho, feito com todo amor e carinho, para receber o menino Jesus, mas agora o que ele tinha diante de si era um conjunto de animais pra colocar ali Nosso Senhor. Os anjos do céu cantavam, os animais recebiam a Deus, os pobres pastores vão adorá-Lo, mas São José fez o melhor possível.
Quando achamos que tudo estava tranquilo, Herodes manda matar as crianças: os meninos de dois anos de idade para baixo. Então São José tem que sair para o Egito, meus queridos, com Nossa Senhora e o menino criança para uma terra desconhecida, levando consigo apenas o presente dos magos. Foi o presente dos magos que garantiu o início da vida deles lá, porque a Providência Divina nunca abandona a família! Não se esqueçam disso.
Às vezes a família passa dificuldades, mas, estando unida a Deus, o necessário não falta. O necessário não falta, porque Deus ama e protege a família. Eles passaram dificuldades numa terra estrangeira com outra língua e outra cultura, mas foi para lá que São José levou Nossa Senhora e o menino Jesus. Depois de passar do tempo da morte de Herodes, regressam.
São José, silencioso na Bíblia, é um grande pai que nós temos. Ensina-nos a tradição que ele morreu de pneumonia depois de atender uma casa que havia desabado em pleno inverno, nevava muito. São José não deixava de fazer a caridade. A tradição ensina-nos que depois de atender esta casa, ele voltou doente por causa do frio e teve ali na sua cama a morte mais santa de todas. São José morreu tendo de um lado de sua cama Nossa Senhora; do outro lado de sua cama, Nosso Senhor. Por isso, meus queridos, São José é invocado como patrono protetor da boa morte. Temos que pedir a ele uma boa e santa morte, porque se nós amamos a nossa família, nós nos preocupamos com a salvação dela.
Nós estranhamos uma Santa Rita de Cássia que rezou para que seus filhos morressem, porque somos ainda muito apegados a essa terra. Quando seus filhos haviam sido instigados pelos tios a cometer assassinato a fim de vingar a morte do pai, Santa Rita pediu diante do Cristo crucificado: ‘antes que meus filhos se condenem; antes que meus filhos cometam esse pecado, leve-os’. Ela só tinha os dois e seus cunhados haviam tirado até a sua casa. E Nosso Senhor levou-os, atendendo ao pedido daquela mãe, que entregou para a morte, depois da morte do pai, seus dois filhos, com 15 e 16 anos. Todavia, ela ficou contente, porque eles não foram para o inferno, por não terem se condenado pelo pecado.
Uma coisa que pensamos pouco em nosso tempo, meus queridos, é a graça de Deus na nossa família. Como anda graça de Deus na nossa família? Nós damos tudo para as crianças: cursos, especializações… Isso é importante sim, não é errado, pois a ciência é boa, ainda mais quando iluminada pela luz da fé, mas precisamos dar a fé para os nossos filhos. Esta herança é grande, mas tem sido a última a ser pensada nos tempos em que nós vivemos. Não podemos ficar somente com uma cerimônia de batismo que depois não vivemos. Nós temos que deixar o batismo vivo dentro da nossa família.
E o que falar de Nossa Senhora, meus filhos?
Nossa Senhora, tão bela, tão linda e tão pura não teve medo de responder ao chamado de Deus, reconstruindo a ponte que Eva havia quebrado. Deus quis que ela fosse a sua mãe, que não abandonaria Jesus em nenhum momento. Ela estava presente em tudo, inclusive no final, lá no pé da cruz, quando Nosso Senhor olha pra nós e nos diz algo importante – remontando agora à nossa família: ‘Filho eis a tua mãe; ecce mater tua’. Nossa Senhora foi tão boa mãe, que Jesus quis que ela também fosse nossa mãe. Como é doce uma mãe! Como é sagrado uma mãe! Como é grande uma mãe!
O amor de uma mãe, Deus mesmo compara ao maior dos amores que podemos conhecer nessa terra. Interessante quando Ele diz ‘se até mesmo uma mãe se esquecer do filho’, porque isso é uma coisa absurda, ‘que amamenta, eu não me esquecerei de vós’. Aqui nós vemos também que o tamanho do amor de Deus consegue ser maior até mesmo que o amor de uma mãe. Então, meus filhos, lembramos que nós somos membros da família de Deus. Todos, pelo batismo, somos filhos de Deus; olhando para o Filho, temos Jesus, modelo dos filhos, mas também modelo para todas as mães e modelo para todos os pais.
Feliz daqueles pais que encontram os seus filhos no templo, como encontraram São José e Nossa Senhora o menino Jesus. Esse caminho nós nunca nos arrependeremos de fazer com a nossa família, porque é o caminho da Igreja. Há tantos caminhos que as famílias trilham, de praias, de férias, de tantas coisas, mas se fosse mais trilhado o caminho da Igreja, tudo seria diferente.
Nós temos tantas leis na nossa constituição, que nós nem conseguimos saber todas. Se nós seguíssemos os dez mandamentos, a sociedade já seria bem diferente. Por isso, meus queridos, para ter uma família santa, vamos nos espelhar nessa família: na família de Nazaré, na família de Nosso Senhor.
Ao pais e àqueles que serão, peçam a São José a força, a fidelidade, o amor puro ou até mesmo casto. São José tinha um amor que ia muito além do que essa nossa carne mortal e miserável é capaz. Peçamos a São José essa grandeza de coragem: São José podia ter abandonado tudo para não se incomodar. Em um tempo dos descartáveis como o que vivemos hoje, onde nada dura, onde nada perdura, peçamos a São José que nos ajude a encontrar o verdadeiro tesouro.
Por que hoje o padre falou tanto de São José? Porque São José esteve com Nossa Senhora e com Nosso Senhor. Ele é o que mais próximo de nós que aqui nós temos na nossa humanidade, uma vez que até mesmo o pecado original ele carregou, mas ele foi santificado pelo seu filho, pela sua esposa, pela sua família.
Quando São Luís de França foi se casar, ele que lutou na sétima e morreu na oitava cruzada, a princípio não queria casar, pois queria ser sacerdote, mas teve que se tornar rei com cinco anos, porque seu pai tinha morrido. São Luís de França, ao se casar com a princesa da Espanha para continuar a dinastia da França, disse para sua esposa na noite de núpcias: “até aqui eu lutava para ser santo sozinho, daqui em diante, nós seremos santos juntos”. Que bonito isso! Esse é o exemplo de uma família, de um verdadeiro casal, e que nós precisamos aprender.
Vão para o céu, levem sua família para o céu, porque se nós não conseguirmos, falharemos com aqueles que nos são mais próximos, que partilham o nosso sangue, o nosso afeto, o nosso amor. Rezemos pelas famílias!
Hoje coloquemos todas as famílias aos pés do presépio de Belém:
Jesus, Maria e José: salvai as nossas famílias;
Jesus, Maria e José: salvai as nossas famílias;
Jesus, Maria e José: salvai as nossas famílias.
Em nome do pai, do filho e do Espírito Santo, Amém!