Santo Atanásio referiu à história seguinte aos Padres do Concílio de Nicéia:
Um cristão de Beryto, devendo mudar de habitação, esqueceu de levar consigo, por descuido, uma bela imagem de Nosso Senhor, em tamanho natural. A Providência quis que, depois de sua partida, um judeu fosse habitar na mesma casa, sem dar atenção a imagem que aí ficara. Tendo outro judeu visto a imagem, correu avisar os rabinos do fato que presenciara. Estes, indignados, foram á casa indicada, e, vendo a imagem de que lhes tinham falado, exclamaram referindo-se a Cristo: “Como outrora ele serviu de joguete a nossos pais, a nós também sirva agora”. E começaram a lhe escarrar no rosto, a lhe dar bofetadas, a ferir a santa imagem, dizendo: “Tudo o que nossos pais fizeram ao Nazareno, façamos à sua imagem. E então meteram cravos nas mãos e pés do Salvador. Continuando na sua impiedade, disseram: “Consta-nos que lhe deram a beber fel e vinagre, façamos nós também beber a mesma coisa”. Depois disseram: “Sabemos que nossos pais feriram sua cabeça como uma cana, firamo-la da mesma forma”. E tomando uma cana, feriram a cabeça do Salvador. Enfim acrescentaram: “Afirmam que nossos pais transpassaram seu lado e seu Coração com uma lança. Façamo-lo também, e ajuntemos este ultraje aos outros”. E um deles feriu com uma lança o lado do Senhor. Mas, ó prodígio! Eis que grande quantidade de sangue e água correu por esta abertura. Vendo isso, disseram entre si: “Aqueles que adoram o Crucificado falam muitas vezes de curas por ele operadas. Tomemos deste sangue e desta água, levemos á sinagoga, reunamos todos os doentes, unjâmo-los, e veremos se é verdade o que dizem”. Eles aproximaram então um vaso do lado aberto pela lança, encheram-no de sangue e água que corriam dele, e o levaram proferindo blasfêmias.
Tendo reunido todos os enfermos, ungiram primeiramente, em presença de todos os outros, um paralítico de nascimento, e de repente este se ergue e salta diante dos assistentes, para o espanto de todos, o doente estava perfeitamente curado. A esta notícia comoveu-se toda a cidade, os habitantes deram pressa em levar para o lugar toda sorte de enfermos: paralíticos, coxos, cegos, leprosos. E a medida que todos os enfermos eram ungidos, recobravam a saúde. À esta vista todos os judeus exclamaram: “Glória ao Cristo, que nossos pais crucificaram, e nós crucificamos na sua imagem! Glória ao Filho de Deus, autor de tão grandes milagres! Nele cremos”. Eles então pediram o batismo, e o bispo, ascendendo ao seu desejo, passou muitos dias batizando-os. Santo Atanásio, por esta narração comoveu todos os Padres do Concílio e fez correr as lágrimas. Desta sorte é que ele mostrou que se deve honrar as santas imagens, e que elas eram a fonte das maiores graças. Imitemos nosso Divino Mestre, cujo coração foi tão benfazejo para com seus mais cruéis inimigos, e demos, como ele, o bem pelo mal.
Trecho do livro Sagrado Coração de Jesus segundo Santo Afonso Maria de Ligório