Enquanto em uma sala da Policlínica Gemelli o 266º sucessor de Pedro luta contra a morte, dois poderosos da terra, Donald Trump e Vladimir Putin, negociam o futuro da Ucrânia e da Europa. O aparente diálogo entre o presidente dos Estados Unidos e o chefe da Federação Russa é, na realidade, um cabo de guerra. O presidente americano tem como objetivo estabelecer um eixo preferencial com a Rússia, para separá-la da China, que é o principal adversário dos Estados Unidos em escala global. O objetivo estratégico de Putin é, ao contrário, minar a aliança transatlântica, para separar a Europa dos Estados Unidos e enfraquecer o Ocidente. Ambos os líderes estão convencidos da missão imperial de suas próprias nações. Em seu discurso inaugural na Casa Branca em 20 de janeiro de 2025, Trump expressou na fórmula «America First» a ideia do “destino manifesto” dos Estados Unidos no mundo.
Putin, por sua vez, sempre manifestou a vontade de trazer a Rússia de volta às fronteiras e esferas de influência da União Soviética, cuja dissolução ele sempre considerou «a maior catástrofe geopolítica do século».
A diferença entre as duas visões não está só que a estratégia de Trump para a Ucrânia foi desenvolvida por seus assessores nas últimas semanas, enquanto a de Putin expressa a coerência de alguém que liderou a Federação Russa por vinte e cinco anos. A principal assimetria é que o plano de Trump, marcado por um grosseiro realismo, interpreta a política como um jogo de poder, variável segundo o posicionamento no tabuleiro de xadrez da dominação mundial. A Ucrânia, nesta perspectiva, pode vir a ser uma moeda de troca, submetida aos interesses das grandes potências.
Putin, por outra parte, tem uma filosofia da história, delineada em seu discurso de 12 de julho de 2021 no Valdai Club e em vários outros documentos. A Ucrânia, na sua visão geo-filosófica, está destinada a ser absorvida em território, língua, cultura e fé religiosa por uma Rússia que ressurge, não só dentro de suas antigas fronteiras, mas sobretudo em sua nova missão imperial contra um Ocidente que agoniza.
Putin raciocina em termos de um choque universal de civilizações, Trump em termos de interesses políticos e econômicos contingentes. Entretanto, ambos se fundam em uma mentira. Putin baseia sua narrativa em uma falsificação, que nega as verdadeiras origens de Kiev, que, ao longo da história, pertenceu à civilização cristã do Medievo e não ao Oriente moscovita. Trump quer justificar sua mudança política negando a verdade da agressão russa contra a Ucrânia, iniciada aos fins de 2014 com a anexação da Crimeia.
Os líderes europeus estão consternados: a hipocrisia das democracias em relação aos direitos humanos e à autodeterminação dos povos está mais uma vez desmoronando. Hoje, de Putin a Trump, mas também de Xi Jinping a Erdogan, só existe aquela “lei do mais forte”, que foi formulada pelo historiador ateniense Tucídides. No V Livro da Guerra do Peloponeso, dedicado aos acontecimentos do longo conflito que opôs Esparta a Atenas no final do século V, Tucídides relata o diálogo entre os embaixadores atenienses e os da pequena ilha de Melos, sitiada pela imponente frota ateniense. Os habitantes de Melos rejeitaram o domínio ateniense e foram exterminados impiedosamente. Por isso, depois de ter afirmado que a lei só existe entre aqueles que estão em condição de igual força, Tucídides afirma a existência de uma lei natural, propriamente adotada pelos deuses, segundo a qual o mais forte subjuga com justiça o mais fraco.
Há alguma verdade na declaração de Tucídides. O espetáculo da natureza sempre nos oferece a prevalência da força. Mas supondo que a lei do mais forte prevaleça na natureza, surgem algumas questões: em que consiste a força? E a força é realmente sempre inseparável da justiça? A única resposta verdadeira a essas questões vem da philosophia perennis aristotélico-tomista e, sobretudo, do ensinamento da Igreja Católica, que explica como a primazia que o homem racional atribui à verdade e à justiça não é uma ilusória abstração. O homem, de fato, tem uma vida sobrenatural, que tem seu princípio na graça, uma realidade que transcende e supera toda a natureza e nos introduz na esfera do divino e do incriado. Por isso, São Tomás pôde escrever que o menor grau de participação na graça santificante, considerada em um único indivíduo, é superior ao bem natural de todo o universo (Summa Theologiae, I-II, 113, 9 ad 2).
Quem lê os acontecimentos humanos apenas à luz da força material raciocina como Stalin, que em Yalta, diante de alguém que lhe apontava as exigências de Pio XII sobre a ordem europeia, perguntou: «Quantas divisões tem o Papa?». Mas, em 1953, após o anúncio da morte do líder soviético, Pio XII teria dito a um íntimo: «Agora Stalin verá quantas divisões temos lá em cima!».
A última palavra sempre pertence a Deus, diante de cujo tribunal todo homem, até mesmo um Papa, se apresenta. É por esta razão que o Papa Francisco, o Vigário de Cristo, é hoje objeto das orações dos católicos do mundo todo. O que mais importa não é a saúde do corpo, mas a da alma, que enfrenta o limiar da eternidade. As orações dos católicos, neste momento, também dizem respeito ao futuro da Igreja, da qual depende o futuro da sociedade mundial, justamente por causa da prevalência que a ordem espiritual tem sobre a natural.
A primazia do espírito sobre a matéria nos diz que não há paz possível sem o respeito aos princípios da lei natural e divina, que não podem ser violados impunemente. «Sabemos de fato – advertia Pio XII – que tudo o que é feito sem a propiciação divina é deficiente e estéril, segundo a sentença do salmista: ‘Se não é o Senhor que edifica a casa, em vão trabalham os que a constroem’» (Discurso Optatissima pax, 18 de dezembro de 1947).
Segundo a Escritura, quem escuta a voz da Sabedoria “julgará as nações” (Eclesiástico 4:16). E a voz da Sabedoria nos diz que a verdadeira e única força que move o universo não é a econômica, militar ou energética, mas a espiritual. Aquele que extrai esta força de Deus, criador e senhor do Céu e da Terra, nada teme. Por esta razão, um verdadeiro católico hoje não se deixa seduzir por nenhum líder ou ideologia política, senão que busca, em palavras e ações, a fidelidade ao Evangelho e à sua lei. Seu lema é God First! Só Deus!
Fonte: Roberto de Mattei