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Os setes pecados contra o Espírito Santo: Uma tragédia sinodal

Vitral São Irineu de Lyon
Por Cardeal Gerhard Müller

Quem realmente quiser escutar o que o Espírito diz à Igreja não confiará em inspirações espiritualistas nem em banalidades ideológicas “woke”, senão que depositará toda sua confiança, na vida e na morte, unicamente em Jesus, o Filho do Pai e o Ungido do Espírito Santo.


“Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas” (Ap 2,11). Esta passagem da Escritura é citada com frequência para justificar uma suposta “Igreja sinodal”, um conceito que, ao menos em parte se não completamente, contradiz a compreensão católica da Igreja. Facções com segundas intenções sequestraram o princípio tradicional de sinodalidade, que implica a colaboração entre bispos (colegialidade) e entre todos os crentes e pastores da Igreja (baseado no sacerdócio comum de todos os batizados na fé), para promover uma agenda progressista. Ao dar um giro de 180 graus, busca-se que a doutrina, a liturgia e a moralidade da Igreja Católica sejam compatíveis com uma ideologia neo-gnóstica e “woke”.

Suas táticas são notavelmente similares às dos antigos gnósticos, sobre quem Irineu de Lyon, elevado a Doutor da Igreja pelo Papa Francisco, escreveu: “Mediante suas plausibilidades habilmente construídas [eles] desviam as mentes dos inexperientes e os tomam cativos. […] Estes homens falsificam os oráculos de Deus e se provam a si mesmos como intérpretes malignos da boa palavra da revelação. Mediante palavras ilusórias e plausíveis, astutamente seduzem os simples a indagar [em uma compreensão mais contemporânea]” até que não possam “distinguir a falsidade da verdade” (Contra as heresias, Livro I, Prefácio). A revelação divina direta é instrumentalizada para tornar aceitável a autorrelativização da Igreja de Cristo (“todas as religiões são caminhos para Deus”). A comunicação direta entre o Espírito Santo e os participantes do Sínodo é invocada para justificar concessões doutrinais arbitrárias (“matrimônio para todos”, leigos no cume do “poder” eclesiástico; a ordenação de diaconisas como troféu na luta por direitos da mulher) como resultado de uma percepção superior, capaz de superar qualquer objeção da doutrina católica estabelecida.

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Mas qualquer um que, apelando a uma inspiração pessoal ou coletiva do Espírito Santo, busque reconciliar o ensinamento da Igreja com uma ideologia hostil à revelação e com a tirania do relativismo, é culpável de várias formas de “pecado contra o Espírito Santo” (Mt 12, 31; Mc 3, 29; Lc 12, 10). Isto, como será explicado a seguir em sete aspectos diferentes, não é outra coisa senão uma “resistência à verdade conhecida”, quando “um homem resiste à verdade que reconheceu, para pecar com maior liberdade” (Tomás de Aquino, Suma Teológica II-II, q.14, a.2)

1. Em relação ao Espírito Santo como pessoa divina

É um pecado contra o Espírito Santo não o confessar como a pessoa divina que, em unidade com o Pai e o Filho, é o único Deus, e confundi-lo com a divindade anônima e numinosa dos estudos de religião comparada, com o espírito popular coletivo dos românticos, a volonté générale de Jean-Jacques Rousseau, o Weltgeist de Georg W. F. Hegel, ou a dialética histórica de Karl Marx, e finalmente com utopias políticas, desde o comunismo até o trans-humanismo ateu.

2. Em relação a Jesus Cristo como plenitude da verdade e da graça

É um pecado contra o Espírito Santo reinterpretar a história do dogma cristão como uma evolução da revelação, refletida em níveis avançados de consciência na Igreja coletiva, em vez de confessar a plenitude insuperável de graça e verdade em Jesus Cristo, o Verbo de Deus feito carne (Jo 1, 14-18).

Irineu de Lyon, o Doctor Unitatis, estabeleceu de uma vez por todas, contra os gnósticos de todos os tempos, os critérios da hermenêutica católica (ou seja, epistemologia teológica): 1) a Sagrada Escritura; 2) a tradição apostólica; 3) a autoridade docente dos bispos em virtude da sucessão apostólica.

De acordo com a analogia do ser e com a fé, as verdades reveladas da fé nunca podem contradizer a razão natural, mas podem (e de fato o fazem) chocar com seu uso ideológico. Não há a priori novos conhecimentos científicos (sempre falíveis em princípio) capazes de invalidar as verdades da revelação sobrenatural e da lei moral natural (sempre infalíveis em sua natureza interna). O Papa, portanto, não pode nem satisfazer nem decepcionar as esperanças de mudança nas doutrinas reveladas da fé, porque “este ofício de ensinar não está acima das palavra de Deus, senão que a serve, ensinando unicamente o que foi transmitido” (Dei Verbum, 10).

A única e eterna parábola de nossa relação com Deus sempre será o Verbo feito carne, pleno de graça e verdade (Jo 1, 14-18). Frente ao delírio de superioridade intelectual dos gnósticos antigos e modernos, com sua crença na auto-criação e autorredenção do homem, a Igreja afirma que a pessoa de Jesus Cristo é a verdade plena de Deus, uma “novidade” insuperável para todos os homens (Contra as Heresias, Livro IV, 34, 1). Porque: “Em nenhum outro há salvação, porque debaixo do céu não há nenhum outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (At 4, 12).

3. Em relação à unidade da Igreja em Cristo

É um pecado contra o Espírito Santo entregar a unidade da Igreja no ensinamento da fé à arbitrariedade e ignorância das conferências episcopais locais (que supostamente desenvolvem doutrinas em ritmos diferentes) sob o pretexto de uma dita descentralização. Irineu de Lyon afirma contra os gnósticos: “Embora dispersa por todo o mundo, inclusive até os confins da terra, […] a Igreja Católica possui uma mesma fé em todo o mundo” (Contra as heresias, Livro I, 10, 1-3).

A unidade da Igreja universal “em um só corpo e um só Espírito” está fundamentada cristológica e sacramentalmente. Porque: “um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual está sobre todos, atua por todos e está em todos” (Ef 4, 5-6). E é contrário a esta mesma “unidade do Espírito” (Ef 4, 3) envolver os membros da missão global da Igreja (leigos, religiosos e clérigos) em uma luta pelo “poder” no sentido político, em vez de compreender que o Espírito Santo efetua sua cooperação harmoniosa. Para que todos nós, “vivendo na verdade e no amor, cresçamos plenamente em Cristo, que é a cabeça” (Ef 4, 15).

4. Em relação ao episcopado como instituição de direito divino

É um pecado contra o Espírito Santo, quem, através do sacramento da Ordem, designou os bispos e sacerdotes como pastores da Igreja de Deus (At 20, 28), depô-los ou inclusive secularizá-los puramente por critério pessoal, sem processo canônico. Os critérios objetivos para as medidas disciplinares contra bispos e sacerdotes são a apostasia, o cisma, a heresia, a má conduta moral, um estilo de vida claramente anti-espiritual e a incapacidade evidente para exercer o cargo. Isto é especialmente certo na seleção de futuros bispos, quando o candidato, designado sem uma cuidadosa avaliação, não tem “firme domínio da palavra segundo a doutrina segura (sana doctrina)” (Tt 1, 9).

5. Em relação à lei moral natural e aos valores inegociáveis

É um pecado contra o Espírito Santo que os bispos e teólogos apoiem o Papa publicamente só quando ele favorece suas preferências ideológicas. Ninguém pode ficar em silêncio quando se trata de defender o direito à vida de cada pessoa desde a concepção até a morte natural. Pois o Papa é o máximo intérprete autêntico da lei moral natural na terra, onde a palavra e a sabedoria de Deus resplandecem na existência e no ser da criação (Jo 1, 3). Se a lei moral natural, evidente à consciência de cada ser humano (Rm 2, 14), não é a fonte e o critério para julgar as leis estatais (sempre falíveis), o poder político deriva para o totalitarismo, e pisoteia os direitos humanos naturais que devem ser a base de toda sociedade democrática e estado constitucional. Isto é o que o Papa Pio XI declarou na encíclica Mit Brennender Sorge (1937) contra as formalmente legais Leis de Nuremberg do estado alemão: “É à luz dos mandamentos desta lei natural que todas as leis positivas, seja quem for seu legislador, podem ser avaliadas em seu conteúdo moral, e, portanto, na autoridade que exercem sobre a consciência. As leis humanas em flagrante contradição com a lei natural estão adoecidas de um vício original, que não pode ser curado nem com as opressões nem com o aparato da força externa” (Mit Brennender Sorge, 30).

6. Em relação à Igreja como sacramento de unidade humana

É um pecado contra o Espírito Santo quando a divisão política e ideológica da sociedade a partir do Iluminismo Europeu e da Revolução Francesa se incorpora numa filosofia da história restauradora ou revolucionária, paralisando a Igreja una, santa, católica e apostólica ao fazer conflitar internamente facções “progressistas” contra facções “conservadoras”.

Pois a Igreja em Cristo não só é o sacramento da comunhão mais íntima da humanidade com Deus, mas também um sinal e instrumento da unidade da humanidade em seu propósito natural e sobrenatural (Lumen Gentium, 1).

O discernimento dos espíritos não se faz com vistas a metas políticas, mas teologicamente, em relação com a verdade da revelação, apresentada na doutrina infalível da Igreja. Portanto, o critério objeto da fé católica é a ortodoxia frente à heresia (e não a vontade subjetiva de preservar ou mudar aspectos culturais contingentes).

Com a proximidade do 1700º aniversário do Concílio de Nicéia (325), poderíamos ter presente o seguinte lema: Melhor ir ao exílio cinco vezes com Santo Atanásio do que fazer a mais mínima concessão aos arianos.

7. Em relação à natureza sobrenatural do cristianismo, que se opõe à sua instrumentalização para fins mundanos

O pecado mais atual contra o Espírito Santo é negar a origem e caráter sobrenatural do cristianismo para subordinar a Igreja do Deus Trino aos objetivos e propósitos de um projeto de salvação mundano, seja a neutralidade climática eco-socialista ou a Agenda 2030 da “elite globalista”.

Quem realmente quiser escutar o que o Espírito diz à Igreja não confiará em inspirações espiritualistas nem em banalidades ideológicas “woke“, senão que depositará toda sua confiança, na vida e na morte, unicamente em Jesus, o Filho do Pai e o Ungido do Espírito Santo. Só Ele prometeu a seus discípulos o Espírito Santo de verdade e amor para toda a eternidade: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra e meu Pai o amará, e nós viremos a ele e nele faremos nossa morada. […] Mas o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, irá ensinar-vos todas as coisas e vos recordará tudo o que vos tenho dito” (Jo 14, 23-26).

Fonte: First Things

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