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Por uma Política Externa verdadeiramente Cristã

Francisco reunido com embaixadores creditados junto à Santa Sé / Foto: Reprodução CTV
Por Rodrigo Müller do Valle

O Estado Cristão deve ordenar-se a Deus em todas as esferas de atuação. Como a política externa faz parte de toda a montagem de um governo, logo, ela também deve estar ordenada a Deus.

Considerações iniciais

Inicialmente, devem ser ditas algumas palavras sobre a iniciativa e a participação dos leigos na formulação de um plano de governo que defenda o Reinado Social de Nosso Senhor Jesus Cristo. A atuação política, como se sabe, é uma das vocações principais do católico, uma vez que, por meio dela, importantes ações são tomadas, impactando a vida nacional. Nesse sentido, a vida social, econômica, política, religiosa e familiar são impactadas por decisões que não são tomadas por todas as pessoas, mas, sim, por poucas que, ao decidirem disputar o poder, acabam por decidir questões que, muitas vezes, são contrárias aos princípios da Santa Madre Igreja.

Negligenciar a atuação política é, além de falta de caridade, uma ingenuidade, pois o poder é crucial para a defesa de nossos princípios católicos. Sem ele, podemos ter a Sabedoria e a Verdade, mas não conseguiremos defendê-las caso não disputemos e coloquemos a nossa voz para ser ouvida. Dito isso, é com grande alegria que recebo a notícia que meus irmãos em Cristo do Centro Anchieta publicam, por meio deste Portal, uma proposta de plano de governo, elaborada pelo Prof. Carlos Nougué, cujo centro seja Nosso Senhor Jesus Cristo. Essa ideia traz esperança, pois defender a Fé no ambiente público é um ato de coragem e grande responsabilidade.

Como toda boa iniciativa, para dar frutos, é necessário que haja uma fonte de alimento e inteligência. Nesse sentido, a Providência Divina foi generosa com o movimento da Liga Cristo Rei, uma vez que nos presenteou com um intelectual de primeira grandeza. Sem a participação do maestro Carlos Nougué, a tarefa de elaborar um plano de governo cristão tornar-se-ia hercúlea, pois deveríamos estudar e meditar em tudo que esse brilhante professor já percorreu. Assim sendo, deve-se dar graças ao bom Deus por esse homem que, certamente, irá conduzir de forma magistral os trabalhos.

A atuação dos institutos católicos tem ganhado projeção ano após ano. Em Curitiba, o Instituto Santo Atanásio tem como compromisso a defesa da Sã Doutrina e da Verdade. Por essa razão, é uma honra representar esse excelso instituto e colaborar na elaboração desse ambicioso projeto. Agradeço aos seus membros fundadores, principalmente ao presidente Ademir Halinski, por confiar na minha limitada capacidade. Espero contribuir da melhor forma possível e conto com as orações de todos. Por fim, não poderia deixar de citar as breves, porém eloquentes, palavras de São Pio X “instaurare omnia in Christo”. É o que desejo e, caso necessário, darei o sangue de minha vida para que isso ocorra.

Introdução e objetivos desse primeiro trabalho

Nesse primeiro artigo, desejo cumprir três objetivos iniciais. O primeiro deles é expor, de maneira sucinta, a Ciência Política como disciplina fundamental para a compreensão das sociedades; algumas considerações fundamentais sobre as teorias de relações internacionais e, por fim, uma análise do artigo 4° da Constituição Federal de 1988 com comentários à luz da Doutrina Social da Igreja

É, portanto, um texto inicial, que dará início ao debate que desejo propor nesse ponto fundamental: A inserção internacional da Terra de Santa Cruz em uma conjuntura marcada pela modernidade. Nesse sentido, trabalharei questões relativas à conjuntura internacional; os constrangimentos internos e externos para a formulação da política externa, a política externa e a Doutrina Social da Igreja; Globalização e outras questões.

Ao final de todo o projeto, tenho como objetivo construir um argumento sólido, coeso e que possa servir como base para a elaboração de dois pilares de um governo que deseja entronizar Nosso Senhor Jesus Cristo como Rei.

Breve introdução à Ciência Política

A ciência política é uma ciência social que estuda o exercício, a distribuição e a organização do poder na sociedade. Como ciência social, procura estudar os fatos políticos que envolvem tanto acontecimentos e processos políticos, como o comportamento político que se expressa concretamente na interação social. Essa pequena e breve explicação da ciência política serve para compreender que a política externa de qualquer nação é uma política pública e, portanto, um dos pontos principais no processo de formulação é entender a origem do poder.

O conceito de política é derivado do adjetivo originado de polis (politikós), que significa tudo que se refere à cidade e, consequentemente, o que é urbano, civil, público e até mesmo sociável e social. Segundo Aristóteles, o homem é um zoon politikón (animal político), definindo-o assim: “porque o homem vive na polis – e porque a polis vive nele – que o homem se realiza como tal”. Nesse sentido, pode-se perceber a centralidade da política na vida humana que, ainda de acordo com o Estagirita, é algo inescapável para a vida humana.

O sociólogo alemão Max Weber explica que a política é o conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado. Isso pode ser comprovado pelo fato de nós, católicos, querermos modificar a sociedade de tal forma que Nosso Senhor Jesus Cristo seja Rei da Terra de Santa Cruz. Consequentemente, pode-se notar que a política não representa, apenas, as decisões feitas pelas instituições, mas, sim, por grupos, indivíduos ou órgãos do Estado. Hermann Heller corrobora ao trazer o seguinte texto:

“desenvolver e aplicar poder social organizado, ou seja, que o seu poder nasce e mantém-se mediante a cooperação humana dirigida por uma ordenação regular comum, na qual determinados indivíduos cuidam do estabelecimento e segurança da ordenação, assim como da atuação unitária do poder de tal modo concentrado”

A atuação política, como visto, não é realizada somente pelo poder Estatal, mas por diversos grupos de pressão e, consequentemente, torna a formulação de qualquer política pública um grande desafio. Nesse sentido, nota-se a complexidade de buscar uma política externa que seja compatível com a Doutrina Social da Igreja.

A política à luz da Doutrina Católica

A política, segundo Santo Tomás de Aquino não pode ser contrária à natureza humana. Nesse sentido, o Estado deve garantir que a busca pela felicidade não seja interrompida. Ora, sabe-se, perfeitamente, que a felicidade perfeita se realiza na Pátria Celeste e, por esse motivo, o Estado deverá ter o seu fundamento na autoridade divina; portanto, o Estado deve ser um instrumento para a consecução do fim último do homem.

O comentário de São Tomás de Aquino à Política de Aristóteles diz respeito à ordem que deve ser buscada pelo Estado, uma vez que a política deve ser ordenada, para que se atinja um determinado fim. Esse fim, segundo o Aquinate, é o bem comum e, portanto, deve-se buscar a paz. Fica evidente que o Estado Cristão deve ordenar-se a Deus em todas as esferas de atuação. Como a política externa faz parte de toda a montagem de um governo, logo, ela também deve estar ordenada a Deus.

A política externa, em uma análise preliminar, deve ser orientada para o “interesse nacional”. Nesse sentido, é fundamental recordar o tema da seção anterior, uma vez que a formulação da política não ocorre somente nas estruturas de governo, mas também nas instituições, grupos e organizações. Por essa razão, a definição do interesse nacional e, portanto, da estrutura da política deve consultar todas as partes da sociedade. Sem ouvir as diversas forças e setores produtivos, pode-se gerar instabilidade e, consequentemente, um ambiente fértil para revoluções em qualquer aspecto.

A diplomacia deve almejar a paz e a concórdia em suas relações internacionais. É fundamental, nesse sentido, entender que um Estado católico, segundo à doutrina deve somente utilizar da força para a legítima defesa, ou seja, não iniciar ataques aos outros Estados da comunidade internacional.

As correntes de pensamento das relações internacionais

As teorias de relações internacionais são instrumentos fundamentais para a análise de qualquer inserção internacional, uma vez que trazem conceitos e chaves explicativas para a análise da conjuntura interna e internacional. Sem um bom marco teórico, que possibilite a compreensão da realidade internacional, qualquer política externa seria inócua e, consequentemente, não traria os resultados necessários para o desenvolvimento da nação.

A principal teoria de relações internacionais é o realismo. Segundo essa teoria, há algumas premissas centrais na análise da política internacional: 1) centralidade dos Estados nas relações internacionais; 2) o tema principal das relações internacionais é a segurança; 3) o poder é fundamental para que um Estado possa se defender e, portanto, a busca do equilíbrio de poder é algo importante; 4) os Estados se ajudam, desde que não interfiram no interesse nacional; 5) a anarquia internacional é insuperável, uma vez que não há um governo mundial que ordene as relações entre os estados.

A teoria concorrente do realismo nas relações internacionais é o idealismo. De acordo com os seus formuladores, pode-se notar, também, premissas básicas para a compreensão dessa teoria: 1) o livre comércio gera interdependência e, portanto, a paz; 2) estados democráticos, por consultar a população, têm menor chance de entrarem em conflitos sistêmicos; 3) a criação de instituições internacionais são instrumentos fundamentais para garantir a estabilidade e a paz nas relações internacionais.

Essas duas correntes principais servirão como um marco para o início da discussão sobre a política externa do Estado Cristão. Além disso, a Encíclica Immortale Dei, do Papa Leão XIII, juntar-se-á para, posteriormente, formular uma política externa que garanta a soberania do Estado Nacional e o bem-estar de toda a população brasileira, já que o objetivo principal é resguardar a Terra de Santa Cruz.

A política externa na Constituição Brasileira de 1988

Não é possível construir um Estado Cristão sem conhecer o que se tem até o momento. Como nós, católicos, não somos revolucionários, conhecer o edifício principiológico da nossa condução internacional é tarefa primária. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 4°, elenca a posição do Brasil nas relações internacionais. De acordo com o texto da CF/88:

“A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

I. Independência nacional

II. Prevalência dos direitos humanos

III. Autodeterminação dos povos

IV. Igualdade entre os Estados

V. Defesa da paz

VI. Solução pacífica dos conflitos

VII. Repúdio ao terrorismo e ao racismo

VIII. Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade

IX. Não intervenção

X. Concessão de asilo político

A partir desses princípios entabulados na Constituição Federal, pode-se tecer alguns comentários de cada um dos incisos à luz da moral e doutrina da Santa Madre Igreja. O meu objetivo, aqui, não é fazer uma longa exposição filosófico-teológica, mas, sim, pontuar algumas questões pertinentes para os próximos artigos, nos quais tratarei com maior profundidade cada um deles.

I. Independência nacional: esse princípio deve ser entendido como a luta por não se deixar subjugar por nenhuma potência estrangeira ou organização internacional que tenha como objetivo limitar a capacidade de ação do Estado Brasileiro. No Estado Cristão, esse princípio deve ser defendido com zelo e responsabilidade.

II. Prevalência dos Direitos Humanos: esse é um tema delicado na atual conjuntura internacional. O Pacto de São José da Costa Rica de 1969 é uma convenção que o Brasil assinou, em 1992, e possui artigos importantes como a defesa da vida desde a concepção e outros artigos defendendo a família. O que o Estado Cristão deve evitar é politizar o tema e não assinar instrumentos internacionais que não estejam vinculados à moral e à constituição nacional.

III. Autodeterminação dos povos: esse princípio é importante, uma vez que se combina com o primeiro inciso (independência nacional). Além de ser um princípio de defesa, mostrando a coerência do discurso, o Estado Cristão deve apoiar a independência das nações subjugadas pela tirania.

IV. Igualdade entre os Estados: a igualdade jurídica entre as nações é um princípio fundamental para a estabilidade do Direito Internacional. O Brasil luta por esse princípio desde a II Conferência de Haia, em 1907, quando Rui Barbosa defendeu a igualdade para a formação do Tribunal Permanente de Arbitragem. Caso não haja igualdade jurídica entre as nações, a política de força será utilizada e, consequentemente, aquelas nações com capacidade nuclear terão maiores condições de forçar outros Estados a adotarem práticas que os favoreçam.

V. Defesa da paz: como bem postula Santo Tomás de Aquino, o Estado deve, em suas relações com outras potências, garantir a paz. Nesse sentido, a defesa desse princípio, de forma correta, é crucial para a posterior formulação da política externa do Estado Cristão.

VI. Solução pacífica de conflitos: se o principal objetivo do Estado Cristão é a manutenção da concórdia, o Brasil deve ser uma nação com legitimidade para, quando eclodir uma guerra no sistema internacional, poder chamar as partes para negociações diplomáticas, oferecendo bons ofícios e mediação. São Paulo exorta os cristãos não serem criadores de contenda, mas, sim, mediadores da paz. É, portanto, um princípio que se deve trazer com cuidado.

VII. Repúdio ao terrorismo e ao racismo: esse princípio deve ser mantido, mas a defesa dele deve ser modificada. O Estado Cristão deve ser intransigente com células terroristas como a Al-Qaeda, Hamas, Hezbollah e Jihad Islâmica, mas deve, também, posicionar-se de forma contundente contra os cartéis de drogas como Cartel de Los Soles, FARC, Primeiro Comando da Capital, Comando Vermelho. Esses grupos narcotraficantes estão ligados ao tráfico internacional e, por essa razão, o Estado Cristão deve buscar soluções concertadas com outras nações. Em relação ao racismo, ficam as palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo que não faz acepção de pessoas. Nesse sentido, a Sã Doutrina é categórica ao afirmar que não se pode tratar as raças de forma inferiores, afinal, Nosso Senhor Jesus Cristo veio para redimir toda a humanidade.

VIII. Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade: o Estado Cristão se relacionará com outros Estados de forma comercial. Nesse sentido, o comércio entre as nações deve ser fomentado, mas de forma que o Estado Cristão não apoie, ao realizar o comércio, governos espúrios e tirânicos. É, portanto, fundamental compreender que os fins não justificam os meios.

IX. Não intervenção: a não intervenção em assuntos internos é um princípio importante, mas que, atualmente, a práxis de defesa do princípio não está de acordo com um Estado Cristão. Esse é um tema que aprofundarei, com muito mais detalhes, em outro artigo, uma vez que o tema é bastante delicado.

X. Concessão de asilo político: atualmente, o Brasil é signatário da Convenção de Caracas de 1954 e outros documentos internacionais. O asilo político dever ser concedido, desde que a pessoa que peça não seja responsável por turbulência interna. Nesse sentido, não se pode abrigar no Brasil Cristão um líder revolucionário que, por malogro em sua tentativa, se vê perseguido por um governo. Além disso, o Brasil não pode abrigar, em nenhuma hipótese, pessoas vinculadas ao terrorismo.

Restaurando as Coisas em Cristo

Vistas as questões introdutórias sobre ciência política, teoria de relações internacionais, a política segundo a Sã Doutrina e os princípios que regem as relações internacionais do Brasil, previstas no artigo 4° da Constituição Federal de 1988, é momento oportuno para abrir o segundo tópico dessa discussão fundamental na consolidação da Terra de Santa Cruz. Para que isso ocorra; no entanto, faz-se necessário uma análise em três aspectos: o primeiro relaciona-se com a Encíclica Immortale Dei que é a Constituição Cristã. Em um segundo momento, deve-se analisar as perspectivas históricas da inserção internacional do Brasil, uma vez que o país não pode ser recriado e, por fim, propor os novos princípios que regem as relações internacionais da Terra de Santa Cruz.

A restauração de todas as coisas em Cristo, frase brilhante de São Pio X, deve estar profundamente vinculada às leituras da Doutrina Social da Igreja (DSI). É por meio dessas encíclicas que extrairemos os tesouros e a Verdade da Sã Doutrina aplicada aos problemas sociais. Sem a Luz do Magistério não há, em nenhuma hipótese, Estado Cristão. A Immortale Dei, encíclica de Leão XIII, é a base para a formulação da Constituição dos Estados e, como tal, rege as relações internacionais. Além dela, a Divini Redemptoris, Non abbiamo bisogno e Mit Brennender Sorge são fundamentais, uma vez que pautam a condenação do Comunismo, Fascismo e Nazismo respectivamente. Esse corpo doutrinário é fundamental para iniciar a formulação dos princípios que guiarão a Terra de Santa Cruz.

O corpo doutrinário da Doutrina Social da Igreja (DSI) não pode ser considerado de maneira crua, uma vez que a Terra de Santa Cruz possui mais de 500 anos de existência política. Ao longo desses cinco séculos, muitos formuladores de política externa foram pessoas, verdadeiramente, cristãs que entenderam a geografia do país. Napoleão Bonaparte disse, durante a campanha francesa contra a Áustria, que a geografia é destino. Isso significa que ao formular uma política externa, é imprescindível que se busque defender a soberania, as fronteiras, os acordos de defesa, a realidade econômica e social e etc. Para que isso seja feito de maneira adequada, é necessário rever um pouco da história diplomática da Terra de Santa Cruz. Por essa razão, será fundamental conhecer, profundamente, o pensamento diplomático brasileiro, iniciado com os portugueses.

A junção do conhecimento diplomático brasileiro e da Doutrina Social da Igreja permitirá a formulação de pressupostos fundamentais para a elaboração dos princípios de política externa. Como a Terra de Santa Cruz se relacionará com nações que não são cristãs e, além disso, estará em um ambiente hostil ao cristianismo, deve-se buscar uma política externa que cumpra dois pontos básicos: 1) Pragmatismo de ação internacional: o Brasil deve se relacionar com as demais nações da comunidade internacional sem que haja uma ideologia norteadora; 2) compromisso com princípios e moralidade: o Ministério de Relações Exteriores da Terra de Santa Cruz deve ser conduzido por princípios cristãos sólidos e inegociáveis.

Breve releitura da Doutrina Social da Igreja aplicada às Relações Internacionais.

A política externa de um Estado Cristão deve prezar, inicialmente, por alguns pressupostos básicos: 1) defesa da Fé Católica nas relações internacionais; 2) observância da lei natural e lei divina; 3) manutenção da estabilidade nas relações internacionais; 4) centralidade do argumento ontológico nas relações comerciais. Esses pressupostos foram extraídos da encíclica Immortale Dei após uma análise detida de todos os seus cinquenta e dois parágrafos. Faz-se necessário, agora, aprofundar esses quatro tópicos antes de avançarmos para outras encíclicas da Santa Igreja Católica.

O primeiro pressuposto que é a defesa da Fé Católica nas relações internacionais é o mais importante, uma vez que dele decorrem os demais. Defender o cristianismo na esfera internacional significa trazer uma identidade católica no trato diplomático, na postura dos diplomatas em relação ao catolicismo, no esclarecimento de que os chefes de Estado, quando em visita à Terra de Santa Cruz, presenciarão atos católicos. Nesse sentido, é responsabilidade do Poder Executivo, seja ele qual for, defender os princípios da fé em discussões internacionais. Não se pode deixar de exprimir as posições internacionais do Brasil de forma laxa ou laicista.

O segundo pressuposto que é a da manutenção da lei natural e da lei divina está relacionado à agenda internacional nos organismos multilaterais e ao direito internacional. Como se sabe, a Organização das Nações Unidas, o Mercado Comum  do Sul, a Organização Mundial do Comércio e outras organizações são as responsáveis por debater os temas mais importantes das relações internacionais (clima, direitos humanos, meio ambiente e etc.). Nesse sentido, a posição do Brasil, em cada um dos temas, deve ser da defesa da lei natural e da lei divina. Explico melhor com um exemplo: Em uma discussão sobre Direitos Humanos, um determinado representante defende o aborto como instrumento de segurança e estabilidade nas relações internacionais. A postura do diplomata do Brasil deve ser categórica ao rechaçar qualquer participação em um documento desse tipo. Em questão do Direito Internacional, a postura do Brasil deve basear-se na justiça à luz da doutrina de Santo Tomás de Aquino (Apêndice sobre o tema no final do artigo).

O terceiro pressuposto básico é a manutenção da estabilidade das relações internacionais. Isso quer dizer que a Terra de Santa Cruz deve seguir-se como promotora da paz. Desde a antiguidade, os filósofos buscaram fundamentar as razões justas para a guerra. Com mais de dois milênios de desenvolvimento filosófico, diversos autores como Hugo Grócio, Francisco Suárez, Francisco de Vitória e Santo Tomás de Aquino trabalharam a questão. O Aquinate, na Suma Teológica (II-II, q.40) resume os seis pontos fundamentais para a Guerra Justa: 1) guerra defensiva; 2) que os que são atacados mereçam ser atacados, uma vez que, se livres causarão mais males; 3) possibilidades de vitória; 4) que a situação post bellum seja melhor do que ante bellum; 5) que o propósito da guerra seja promover o bem comum e evitar o mal; 6) que a guerra seja conduzida por autoridade competente. Além da questão da guerra, a Terra de Santa Cruz deve oferecer, em todos os momentos, os seus bons ofícios e mediação nos conflitos internacionais.

O quarto e último pressuposto está relacionado com a inserção econômica da Terra de Santa Cruz. A economia internacional do século XXI é dinâmica, rápida, globalizada e tecnológica. Diferentemente da dinâmica econômica que permeou as nações até a primeira metade do século XX, na qual as transações comerciais eram mais simples e não havia um sistema financeiro complexo, o mundo hodierno apresenta desafios enormes para conciliar as forças econômicas. A encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, combate o socialismo e o liberalismo de forma acidental, uma vez que condena a luta de classes e os movimentos revolucionários e, ao mesmo tempo, não chancela a busca pelo dinheiro de forma imoral e sem vinculação com o bem da alma. Nas relações internacionais, esse pressuposto quer dizer que a Terra de Santa Cruz deve realizar acordos comerciais que tenham como objetivo o bem comum, vinculando-se com todos os três pressupostos anteriormente supracitados. Nesse sentido, os tratados comerciais não devem apoiar a escravidão, a opressão, a busca desenfreada por vantagens e, tampouco, as distorções econômicas.

Uma vez finalizado esses quatro pressupostos básicos sobre a Doutrina Social da Igreja aplicada às relações internacionais, é possível passar para os próximos documentos da Santa Igreja. A encílica Qui Pluribus argumenta que o socialismo é um grande inimigo da Santa Madre Igreja e, por essa razão, a Terra de Santa Cruz, ao negociar com países claramente comunistas deve ter uma postura de prudência e evitar que empresas dessas nações entrem no país e tomem conta de setores produtivos importantes. Da mesma forma, a encíclica Quanta Cura alerta para as mazelas do comunismo. É fundamental compreender, entretanto, que a Terra de Santa Cruz não deve romper relações diplomáticas com a China ou Rússia, por exemplo, uma vez que, na atual conjuntura, tal atitude traria riscos enormes para a segurança do país.

Para finalizar essa primeira parte do artigo é fundamental trazer, ainda, duas outras encíclicas importantes. A primeira delas é a Non Abbiamo Bisogno que condenou o fascismo italiano, uma vez que o grupo Ação Católica, importante movimento tradicional na Itália, foi perseguido pelo ditador Benito Mussolini. Diferentemente do senso comum, o Tratado de Latrão de 1929 não foi um acordo pacífico entre a Santa Sé e Mussolini, mas, sim, uma tentativa de propaganda do regime para alguns católicos desprevenidos. A outra encíclica fundamental é a Mit Brennender Sorge que condena o nazismo pela limpeza racial. Essas duas encíclicas são fundamentais para a Terra de Santa Cruz, uma vez que o país não pode apoiar movimentos dessas naturezas, seja um grupo político ou movimento social.

A experiência da inserção internacional do Brasil em sua história

Fazer um resumo de quinhentos anos de inserção internacional do Brasil é um desafio hercúleo; no entanto, acredito ser possível segmentar a experiência do país em três grandes dinâmicas: ampliação e segurança do território; modificações nas relações econômicas e políticas e atuação na arena internacional. Com base nesse tripé é possível compreender quais eram as forças e os objetivos dos principais formuladores da política externa brasileira e, com isso, fundamentar, em um outro artigo, os eixos fundamentais das relações internacionais. Para esse artigo, essa breve releitura servirá para pontuar quais são os princípios que devem reger as relações internacionais da Terra de Santa Cruz.

O marco inicial da política externa da América Portuguesa é o Tratado de Tordesilhas de 1494, assinado entre Portugal e Espanha que partilhou o Novo Mundo. A partir de 1500, com a chegada dos portugueses na Terra de Santa Cruz, começou um grande processo de ocupação e penetração no território disponível que, para se completar, levou 410 anos. Entre 1500-1580, a ocupação foi, majoritariamente, litorânea. Nas palavras do Frei Vicente Salvador, os portugueses pareciam caranguejos arranhando as costas. Com a União Ibérica (1580-1640), o reino de Portugal foi anexado pelo habsburgo Felipe II, em uma união real. Com isso, os bandeirantes puderam adentrar ao território que pertencia aos espanhóis. Após a União Ibérica, o período 1640-1750 foi de intensa rivalidade entre Portugal e Espanha, uma vez que este era aliado da França e aquele aliado à Inglaterra. A Guerra de Sucessão Espanhola (1702-1713) terminou com o acirramento das rivalidades, principalmente pelo fato do Tratado de Utrecht ter dado posse a Colônia de Sacramento aos Portugueses. Após o tratado, houve mais conflitos entre os irmãos ibéricos, levando, em 1750, ao Tratado de Madri. O século XIX, período das independências das nações latinas, traz como reflexo a herança das rivalidades, notadas, por exemplo na Guerra da Cisplatina (1825-1828) e na Guerra do Paraguai (1864-1870). Durante o século XIX, a diplomacia brasileira trabalhou em assinar acordos de limites e garantir o território da soberania nacional. A finalização da moldura territorial do Brasil termina no início do século XX com a obra do Barão do Rio Branco (1902-1912). Ao longo desse processo, a Terra de Santa Cruz defendeu o interesse nacional com base no respeito ao direito natural e evitou, ao máximo, os choques externos.

A inserção da Terra de Santa Cruz na economia internacional pode ser dividida em três momentos, segundo Amado Luis Cervo. O primeiro deles (1500-1930) é marcado por uma economia agroexportadora voltada para o mercado internacional. Durante esse período histórico, a Terra de Santa Cruz viveu a exportação do açúcar, mineração, café, drogas do sertão. Essa primeira fase é compreendida como o paradigma liberal-conservador, isso quer dizer que a economia era liberal, uma vez que precisava de movimentação do comércio exterior e essa forma de inserção garantia a manutenção da elite conservadora no poder. É durante esse período que as relações com a Grã Bretanha, Holanda, Espanha e Portugal são mais importantes, uma vez que o eixo estruturante das relações internacionais estava voltado para a Europa. A partir do golpe republicano de 1889, o Brasil passou a observar nos EUA o parceiro primordial, uma vez que os americanos eram os maiores compradores de café; no entanto, o modelo de inserção internacional manteve-se o mesmo, pois o comércio exterior era a prioridade. A situação altera-se, em 1929, com a crise mundial, pois os EUA deixam de comprar o principal produto de exportação do Brasil e, consequentemente, as energias do país voltam-se para a industrialização. Foi durante esse período que se deu a Revolução de 1930 que trouxe Getúlio Vargas ao poder, mudando, completamente, a elite no poder. Esse período dura até o ano de 1980 é conhecido como o período nacional-desenvolvimentista, no qual o país busca a industrialização e urbanização como forma de ganhar projeção econômica. É durante esse período que o Estado se torna o grande responsável pelo desenvolvimento (ex: Plano de Metas – JK). A crise da dívida da década de 1980 e a abertura da década de 1990 marca a última fase da inserção internacional do Brasil e os desafios da competitividade. Nessa última fase, a tecnologia e a educação passam a ser fundamentais na busca pelo interesse nacional.

A atuação da Terra de Santa Cruz na arena internacional começa, em 1907, na Segunda Conferência de Haia, na qual Rui Barbosa, juntamente com o Barão do Rio Branco, defendem a igualdade jurídica entre as nações, um pressuposto fundamental na estabilidade das relações internacionais. Entre a década de 1910 e 1930, o país esteve envolvido na Liga das Nações, organização internacional criada, em 1919, pelo Tratado de Versalhes. Nessa arena, o Brasil defendeu a solução pacífica de controvérsias e buscou uma função protagônica nas relações internacionais. Com a Segunda Guerra Mundial, a Liga das Nações acaba, mas o espírito multilateral permanece na ONU e o Brasil foi um dos membros fundadores. Um país intermediário nas relações internacionais, ou seja, sem grande quantidade de poder militar, não consegue moldar a política internacional de forma solitária e, por essa razão, precisa ganhar legitimidade entre os demais países da comunidade internacional, caso queira moldar o debate internacional. A partir da década de 1950 os temas da agenda internacional proliferam-se (direitos humanos, energia nuclear, descolonização e etc.). Entre 1950-2018, o Brasil alternou três posturas nos órgãos multilaterais: 1) 1950-1990: pouca participação nos órgãos multilaterais; 2) 1990-2003: participação moderada nos órgãos multilaterais; 2) 2003-2018: participação mais intensa.

Com essa leitura resumida dos traços mais marcantes da inserção internacional do Brasil durante sua história, pode-se chegar à conclusão de que os formuladores da política externa tinham algumas preocupações perenes: 1) soberania nacional e controle territorial; 2) manutenção de relações amistosas; 3) desenvolvimento econômico; 4) manutenção da identidade brasileira; 5) participação na construção da ordem internacional. Com base nesses cinco pilares e com as análises prévias da Doutrina Social da Igreja, é possível elaborar os princípios norteadores das relações internacionais da Terra de Santa Cruz.

Os princípios norteadores da política externa da Terra de Santa Cruz

1) Defesa da Soberania Nacional: A Terra de Santa Cruz deve defender o território nacional contra qualquer invasão estrangeira e, para isso, deve manter um exército capaz de garantir a manutenção territorial, o engrandecimento do poder nacional e o respeito do país na comunidade internacional. A Terra de Santa Cruz não pode se sujeitar às ordens de organismos multilaterais em relação ao desarmamento. Como Santo Tomás de Aquino aponta: o Estado não pode ser belicoso, mas deve ser capaz de garantir eficazmente sua defesa.

2) Manutenção de relações amistosas: A Terra de Santa Cruz não deve buscar aumento ou expansão territorial, uma vez que isso implicaria em guerra. As relações do Brasil devem ser cordiais, mas não pode ofuscar o catolicismo do país. Isso quer dizer que o Brasil, em todas as esferas, deve mostrar que se rege pela lei natural e lei divina analisadas anteriormente.

3) Crescimento econômico segundo a reta intenção: é dever de todo o Estado garantir o desenvolvimento econômico para a população. Isso significa que, em suas relações internacionais, o Brasil deve buscar acordos comerciais que tragam estabilidade e desenvolvimento. É preciso, no entanto, salientar que a Terra de Santa Cruz não pode, em momento algum, realizar acordos comerciais com nações que defendam a escravidão e a servidão. Não se pode compactuar com esse comportamento contrário àquilo que Nosso Senhor Jesus Cristo trouxe: a verdadeira liberdade.

4) A catolicidade da ação externa: a política externa do Brasil deve ser o espelho do estado cristão implementado internamente. Isso quer dizer que o corpo diplomático brasileiro deve defender os valores metafísicos e religiosos. É, por essa razão, que a formulação da política externa deve ser realizada de forma conjunta com diretores religiosos e autoridades.

5) Participação moderada na construção da ordem internacional: A Terra de Santa Cruz deve contribuir para a construção da ordem internacional, mas deve ausentar-se de qualquer iniciativa globalista, maçônica e comunista. Não se deve, por exemplo, participar do Diálogo Interamericano ou Comissão Bildeberg.

6) Princípio da caridade: A Terra de Santa Cruz pode acolher refugiados ou asilados políticos, mas deve, sempre, realizar um grande escrutínio prévio, evitando qualquer tipo de ação que possa desestabilizar a nação.

Esses são os princípios básicos que devem reger as relações internacionais da Terra de Santa Cruz. No próximo artigo, tratarei da conjuntura internacional e nacional do país, uma vez que é fundamental conhecer os constrangimentos internos e externos para, posteriormente, apontar as diretrizes e os relacionamentos preferenciais.

Salve Maria Santíssima!

Viva Cristo Rei!

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