Esta reflexão é uma grande estraga-prazeres, mas, garanto, fará bem a quem tiver a coragem de ler até o final e ter boa vontade de entender o meu ponto. Não há momento melhor que esse 15 de novembro para trazer o problema à baila.

No Mênon, Platão afirma que uma opinião boa é tão útil ao homem quanto a ciência, isto é, o conhecimento exato e confirmado. As boas opiniões têm feito um grande bem atualmente: os sonhos das novas gerações com aquilo que não viveram (para utilizar o jargão chestertoniano em voga entre os influenciadores mais apaixonados) incitam-nas à busca e ao restauro de tudo aquilo de melhor que a nossa civilização produziu outrora.

Porém, a maior parte disso é opinião, boa opinião de fato, nascida da contemplação daquela beleza que salva o mundo (para citar outro jargão corrente em nossos meios) e que encontramos em Missas bem celebradas em belas igrejas góticas apinhadas de cavalheiros imponentes e moças com véu.

Outrossim temos que concordar com Platão quando ele diz na mesma obra que a ciência é melhor do que a opinião correta, mesmo que ambas sejam úteis. Os problemas começam quando a opinião quer tomar o lugar da ciência, e quando os fenômenos, símbolos e aparências são mais venerados do que a realidade por trás deles, para a qual eles estão como a moldura está para a tela.

Que raios isso tem a ver com o feriado? Veja bem: é problemático que façam bandeiraço monarquista e discursos contra o golpe republicano aqueles que no dia anterior forem à Missa tradicional e derem alguns brados contra a maçonaria e o liberalismo. Não parece contraditório que alguns dos católicos que mais aparentam devoção façam diatribes em favor do império, sendo que este passou por cima dos direitos da Igreja na Questão Religiosa e foi em grande medida construído sobre fundamentos políticos liberais? Será que ignoram que a burocracia imperial estava entremeada de maçons militantes? E, caso alguém tenha chego até aqui e não esteja fazendo um pequeno esforço para me compreender bem, vou ser um pouco mais preciso.

Isto não uma condenação in limine da antiga monarquia brasileira, e nem a negação de seus méritos como fautora do período de maior prosperidade e desenvolvimento social da história de nosso país. Tampouco é a negação de que a monarquia seja um regime de governo preferencial, nem uma defesa da carnificina que veio logo na sequência do infame golpe. Isto é, nada mais nada menos, do que uma chamada de atenção para problemáticas reais, que devem ser encaradas com coragem e sem menosprezo cínico.

Posso sintetizar meu apelo da seguinte forma: é necessário ter tanto amor à verdade quanto se tem pela beleza. É acidental que se constate isso no episódio que será celebrado neste dia 15, pois há muitas situações em que se exibe este fenômeno paradoxal.

Entre meus próximos, e mesmo entre o público geral, se fala sobre a necessidade de sábios; nunca foi tão urgente que as pessoas cultivem o amor à verdade que os sábios possuem.

Todavia, nos debates públicos entre os católicos, o que podemos constatar no mais das vezes são meras defesas apaixonadas de símbolos, discussões que não estão fundamentadas em fatos e não buscam a defesa de posições reais. Ao contrário, são defesas ou ataques de narrativas ou símbolos que mexem com as afeições de certos indivíduos envolvidos, que formam suas sublimes opiniões mais em publicações do Facebook (onde há todo um espectro de palpitaria que vai desde memes de páginas “tradicionalistas” até o bom e velho “textão” de algum jovem em idade escolar recém-convertido) do que com aquele estudo metódico e recolhimento tão salutares à maturidade intelectual.

No fim, tudo torna-se um gigantesco atletiba entre concílio e tradição, novus ordo e missa tridentina, monarquia e república, e assim por diante. Há de se enfatizar mais uma vez, estas palavras ou conceitos estão sempre esvaziados de qualquer conteúdo objetivo: são meros gatilhos emocionais.

Eis o lembrete deste 15 de novembro: é necessário ver as coisas como elas são. Nem cinza nem cor-de-rosa, nem 8 nem 80. Enquanto não se tem isso bem claro, é melhor calar-se e não se arrogar uma autoridade que não se tem, postura que sabota a causa de Igreja por dentro e a deslegitima por fora. Não é a ocasião de me aprofundar, mas vale citar que os fracassos por que tem passado o movimento católico nos últimos três séculos tem a ver em parte com a conduta que aqui tratamos. Admitamos, portanto, que, neste vale de lágrimas da história, a luz e as trevas se mesclam por todo lado e até o juízo final essa será a realidade. Não se deve dar ouvidos a qualquer um que aja como se fosse portador da luz e que tenha a pretensão (ou apenas boa opinião que não resiste ao menor crivo da ciência) de poder separá-la das trevas. Afinal, pode ser que ele seja mesmo.