O Evangelho deste segundo domingo nos apresenta pela primeira vez no Advento a São João Batista, quem, com sua pregação no deserto da Judeia, clamou ao povo de Israel para converter-se, para estar preparado para a iminente vinda do Messias. Por isso é denominado o “precursor”, aquele que vai antes de Jesus para dar testemunho d’Ele mediante sua pregação e seu martírio.
A missão de São João Batista é o último momento da preparação que Deus havia feito para a vinda de seu Filho à terra, anunciando-a e confirmando a esperança do Povo de Israel mediante os Profetas. E assim o Evangelho do 4º domingo do Advento (Lc 3, 1-6) nos apresenta a pregação de São João Batista como o cumprimento da profecia de Isaías (Is 40, 3-5) que predisse o cativeiro do povo hebreu na Babilônia, mas agora o consolava com o anúncio de sua liberdade; visão esta que se estende aos tempos messiânicos: João é a voz que clama na deserto: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas. Todo vale será aterrado, e todo monte e outeiro serão arrasados; se tornará direito o que estiver torto, e os caminhos escabrosos serão aplainados. E toda carne verá a salvação de Deus” (Lc 3, 4-6).
A comoção que o Batista produziu com sua pregação de penitência e seu modo de viver foi tão grande, que muitos creram que ele fosse o Messias prometido. Para evitar este engano, João evidencia sua missão de “precursor” apontando para Jesus: “Depois de mim vem outro mais poderoso do que eu, ante o qual não sou digno de me prostrar para desatar-lhe a correia de suas sandálias” (Mc 1,7). Em outra ocasião dirá: “Ele tem que crescer, e eu tenho que diminuir” (Jo 3, 30). E estando já na prisão, vemos como enviou seus discípulos para perguntar-lhe: “És tu o que há de vir ou temos que esperar a outro?“. A expressão “o que há de vir” era uma das formas para aludir ao Messias.
O Batista não envia seus discípulos a Cristo para obter uma resposta para si, mas para aqueles que no círculo de seus seguidores não tinham ainda reconhecido a Jesus. Mais uma vez, o Batista aponta para Cristo como o Messias e quer assim dar o testemunho da Luz [1]. A missão de São João Batista foi, portanto, uma convocação à conversão para receber ao Cristo que vem: convida a uma mudança interior, a partir do reconhecimento e da confissão do próprio pecado.
II. A Penitência
A Preparação a que convida João Batista é definida no Evangelho com um termo grego (“metanoia”) que significa “mudança da maneira de pensar”. Esta mudança interior é o que chamamos “conversão” ou “penitência”, uma palavra que pode ser entendida em duplo sentido: como virtude e como sacramento.
- A penitência como virtude, ou penitência interior, é a disposição da alma pela qual nos convertemos verdadeiramente a Deus, detestamos os pecados cometidos, e nos propomos a mudar nossa vida com a esperança de obter o perdão da misericórdia divina.
- A conversão implica ao mesmo tempo o perdão de Deus e a reconciliação com a Igreja, que é o que expressa e realiza liturgicamente o sacramento da Penitência, ou penitência exterior. O pecador arrependido mostra, por suas palavras e atos, ter separado seu coração do pecado cometido; e o sacerdote manifesta, pelo que diz e faz, a misericórdia de Deus, que perdoa os pecados. “A confissão individual e íntegra dos pecados graves seguida da absolvição é o único meio ordinário para a reconciliação com Deus e com a Igreja” [2].
“Ambos aspectos estão tão intimamente interligados, que a penitência como virtude forma parte essencial do sacramento (proporcionando a matéria do mesmo), de modo que a absolvição do sacerdote (que constitui a forma sacramental) seria absolutamente inválida sem os atos da virtude da penitência (arrependimento, confissão e propósito de emenda) praticados pelo penitente” [3].
III. São João Batista e nós
Por fim, podemos perguntar se a mensagem de São João Batista tem algo a nos dizer. Se ainda hoje, dois mil anos depois, é necessário converter-se, preparar-se para receber ao Cristo que vem.
Um poderoso motivo encontramos no tema dominante do Advento, que é preparação para a segunda vinda de Cristo. Ao celebrar anualmente a liturgia do Advento, a Igreja atualiza a longa espera do Messias: participando na preparação da primeira vinda do Salvador, os fiéis renovam o desejo de sua segunda Vinda em glória e majestade [4]. Por isso a Epístola (Rm 15, 4-13) nos insiste na virtude da esperança apoiada na voz de Deus que continua ressoando através das Sagradas Escrituras: “Tudo quanto outrora foi escrito, foi escrito para a nossa instrução, a fim de que, pela perseverança e pela consolação que dão as Escrituras, tenhamos esperança” (v. 4). Se os cristãos esperam a transformação do mundo presente, devem comportar-se de maneira tal, que possam ser encontrados pelo Senhor em uma disposição moral e espiritual que lhes permita entrar nele. A espera da parusia é um poderoso motivo de santificação [5].
“Entretanto, virá o dia do Senhor como ladrão. Naquele dia, os céus passarão estrepitosamente, os elementos se dissolverão abrasados, e será consumida a terra com todas as obras que ela contém. Uma vez que todas essas coisas se hão de desagregar, considerai qual deve ser a santidade de vossa vida e de vossa piedade, enquanto esperais e apressais a chegada do Dia de Deus! Esse dia em que os céus se hão de dissolver inflamados e os elementos se hão de derreter abrasados! Nós, porém, segundo sua promessa, esperamos novos céus e uma nova terra, nos quais habitará a justiça. Portanto, caríssimos, esperando essas coisas, esforçai-vos em ser por Ele achados sem mácula e irrepreensíveis na paz (2Pe 3, 10-14).
À materna intercessão da Virgem Maria confiamos nosso itinerário do Advento, onde nos dispomos a acolher em nosso coração e em nossa vida o Cristo que vem e que nos convida à conversão.
“Excita, Senhor, nossos corações para preparar o caminho de teu Unigênito, para que por sua vinda mereçamos servir-te, purificadas nossas almas. Ele, que contigo vive e reina na unidade do Espírito Santo e é Deus pelos séculos dos séculos. Amém” [6].
[1] Cfr. Manuel de TUYA, Biblia comentada, vol. 5, Evangelios, Madrid: BAC, 1964, 259-262.
[2] Catecismo de la Iglesia Católica, 960.
[3] Antonio ROYO MARÍN, Teología moral para seglares, vol. 2, Los sacramentos, Madrid: BAC, 1994, 254-255.
[4] Cfr. Catecismo de la Iglesia Católica, 522-524.
[5] Cfr. Juan STRAUBINGER, La Santa Biblia, in: 2Pe 3, 3-14; José SALGUERO, Biblia comentada, vol. 8, Epístolas católicas. Apocalipsis, Madrid: BAC, 1965, 171-174.
[6] II Domingo de Adviento, oración: Eloíno NÁCAR FUSTER; Alberto COLUNGA, Misal ritual latino-español y devocionario, Barcelona: Editorial Vallés, 1959, 49.