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Sobre a juventude: Conversão, mundo e esperança

Jovens em oração
Por Enzeo Emmanuel dos Santos

Uma das razões de por que é necessário atentar-se seriamente para a realidade da juventude contemporânea salta aos olhos quando observamos minimamente o nosso entorno e percebemos sob que emaranhado pernicioso e hostil estão a viver os integrantes desta fase da existência humana. Isto é certamente uma das tarefas daqueles que se dedicam em um apostolado cujo público-alvo principal sejam os jovens.  

Aqui deixo consignadas, para este efeito, algumas reflexões sobre o estado atual da juventude e, por fim, o que a faz bela. Tudo com as devidas aplicações teológico-filosóficas. 

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1. Da conversão e do mundo  

Converter-se, estar verdadeiramente inserido no seio da Igreja como católico ex professo e fieltrata-se de um drama de vida ou morte precisamente, do qual não está isenta a juventude, porque os jovens, tanto quanto os indivíduos mais velhos, são chamados à santidade simultaneamente com a possibilidade que trazem de ser condenados ao fogo eterno. E como a pessoalidade de cada qual mantém-se intacta durante todo o percurso vital, os mesmos indivíduos que se corromperem na aurora da vida serão os que, desde o núcleo desta sua corrupção, serão instrumentos pelos quais muitos outros serão corrompidos.  

O nível de instrumentalidade maléfica que vão ter sobre as almas manifestar-se-á tanto mais grave quanto mais se criarem mecanismos extrínsecos de disseminação de vícios a partir da conduta individual de cada uma delas. A estes mecanismos e redes de influência espiritual no conjunto da sociedade chamamos mundo, na acepção que lhe dá o Apóstolo amado. Falemos um pouco sobre ele, pois. 

Nada tão conveniente como vislumbrar algo da conduta que seus súditos tomam perante ele com o tempo. Ainda o idoso que mais se tenha entregado a uma vida viciosa no passado e se imbuído das falsas máximas do mundo, tão contrárias ao Evangelho como são, é capaz de perceber, por concurso da sua experiência vital, que se deixou enganar por muitos erros e vãos anseios, perdendo boa parte do tempo de que dispunha para aperfeiçoar-se, no bom sentido da palavra, em favor de uma progressiva dissolução da existência em particularidades perecíveis e envoltas em trevas. Basta a menor sinceridade para que se admitam os enlaces do mundo, mesmo que quem o faça leve, ainda, uma vida dissoluta, tão conveniente para o mundo, por vários motivos, sendo um deles o fato de que uma vida virtuosa é uma pública repreensão contra seus desvios.  

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Seguramente, é bastante comum que muitos indivíduos com grande experiência que conservam em si inclinações mundanas e adesão aos preceitos diabólicos tenham feito uma distinção pessoal entre o que no mundo lhes convinha e o que não lhes convinha, tendo extraído dele apenas a dose de pecado que lhes aprazia. Mas todos são unânimes em enxergar as ilusões em que se encontram os jovens quando deparam com tudo o que o mundo lhes promete ardorosamente, e que não passa de uma vã ilusão, a qual, sendo advertida de início, pode ser rejeitada – o que, precisamente, não convém para o mundo.  

Um exemplo? Imagine-se um círculo de amigos habituados a comparecer em festas mundanas. Falando com propriedade, nelas a felicidade é prometida implicitamente, apesar de todas as conseqüências funestas que comportam. Um desses amigos, tomando consciência dessas conseqüências, decide simplesmente recusar-se a participar delas diante de novos convites dos seus amigos. Estes então logo começam a questioná-lo do porquê de sua recusa, a insistir em que se aceitem os convites, e enfim a afastar-se dele como de um estranho, de um lunático. Sua presença seria por demais eloqüente para eles em termos negativos: denotaria a culpa própria, pela percepção de seus extravios e exageros. Sem conivência criminosa nem total cumplicidade, os mundanos sentem seu amor-próprio atacado e rebelam-se contra o agressor.  

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Pois bem, uma das razões pelas quais os jovens são tão suscetíveis a estes enganos e se sentem tão amedrontados pelas afrontas do mundo é porque, quando não há pais virtuosos que lhes deem bons exemplos desde a infância nem os ensinem a distinguir entre o certo e o errado, entre o moral e o imoral, objetivamente falando, e mais particularmente entre o que corresponde à vontade de Deus e o que é mera armadilha satânica, eles acabam crescendo e desenvolvendo-se segundo o fluxo das suas paixões, as quais, estando desordenadas, ao entrar em contato com o mundo verão abrir-se-lhes um horizonte inteiro de fontes aparentemente infinitas de felicidade e saciamento. Essa confluência relacional produzirá uma mentalidade e um estilo próprio de vida, que corresponderá a um dos clássicos falsos bens com que se costuma confundir a felicidade.  

Ora, nascemos com uma natureza que, guardando em si um logos inalienável, se vê contudo em estado de abertura para inúmeras possibilidades de direcionamento da sua imensa potencialidade, razão por que pode, atualizando-se no bem, aperfeiçoar-se e absorver algo das perfeições do objeto a que se doa, ou pelo contrário abrir-se passivamente ao esgoto da maldade e comungar com sua fealdade, tornando-se então desordenada, imperfeita e viciosa, porque inundada no pecado.  

E, por mais que alguém nasça com boas inclinações de prática das virtudes e de recusa aos vícios, todos nascemos com o chamado pecado original, com uma tendência inata a satisfazer ao nosso amor-próprio e seus sequazes, de forma que ninguém persevera no bem e se torna verdadeiramente virtuoso sem um auxílio da graça divina.  

Analisando, pois, melhor a equação, chegamos a que, nos dias atuais, com a realidade do mundo, enquanto inimigo da nossa alma, cada vez mais disseminada em seus meios ativos e eficazes de ação, com as mentalidades anticatólicas que pululam por todos os lados, envoltas em materialismo e ceticismo e ideologias doentias, e uma constante descristianização das relações sociais, a devida educação católica no seio familiar é transferida para o que de mais mundano há no Estado, com seus interesses ideológicos, e na internet (veja-se por exemplo a imensa quantidade de crianças que assistem diariamente e desordenadamente a canais de jogos e divertimentos no Youtube, o que é certamente um crime diante de Deus, dado que elas são sujeitas dessa forma a influências nocivas e a danos psíquicos que repercutirão tragicamente a longo-prazo), de modo que as crianças entram na adolescência mais libertinos, dissolutos e viciosos – com a característica particular de um repertório de justificativas aparente racionais e amplamente aceitas em seu entorno social ou pré-acadêmico –, logo se afogando no mundo das drogas, da pornografia, da fornicação, das músicas anticristãs e luxuriosas, como por exemplo as de funk e forró universitário. Dito de outro modo, sem pais que deem aos filhos água limpa e fresca, estes são hidratados como que à força com líquidos fétidos e pútridos de esgoto.  

Como consequência óbvia e previsível de tudo isto e muito mais, temos uma juventude como nunca antes vista, porque caracterizada, dentre outras coisas também graves, pela tristeza, depressão, ansiedade e outros tantos problemas psicológicos advindos comumente da vivência de uma existência sem sentido, na qual o desespero é disfarçado por uma multidão de prazeres.  

E não se trata apenas de jovens depressivos e suicidas, o que já seria por si muitíssimo grave e espantoso, mas também de – pasmem! – crianças depressivas! Porventura não são uma das características destas duas fases iniciais da vida humana a alegria, o contentamento, a motivação? Aliás, por que mesmo aqueles que exteriormente se mostram com freqüência animados caem em estados depressivos ocultos e disfarçam outros problemas psicológicos, senão porque há uma razão muito mais profunda e universal que fundamenta esses problemas, que é a falta de sentido vital legítimo?  

Nunca estiveram à disposição dos homens tantos meios de distração, tantos bens materiais, tantas facilidades, com tamanha velocidade, inclusive mesmo, apesar de ser ainda enorme a pobreza no mundo, riquezas e maiores possibilidades financeiras, coisas com que sequer sonhavam os camponeses da Idade Média por exemplo, e no entanto o mundo atual se encontra essencialmente mais triste e fadado à ruína – este mundo tão falsamente luminoso e movimentado, tão supostamente evoluído e contrastante com as falsas trevas que os inimigos da Santa Igreja atribuem a períodos de esplendor e verdadeira luz da nossa civilização! 

Devemos concluir por ora que, como a juventude é uma fase vital na qual as paixões se afloram e estão a todo o vapor, os jovens são particularmente movidos por seus sentimentos, no transfundo dos quais está a reinar a soberba inclinação à rebeldia que lhes é tão característica, pela qual se sentem capazes de destruir todos os obstáculos morais e às vezes físicos que haja contra a sua liberdade, realidade aliás muito mal compreendida por eles, derrocando então em libertinagem.  

Assente-se também que a fumaça negra do fogo das paixões desordenadas obscurece a razão (ou inteligência) e enfraquece a vontade espiritual, motivo pelo qual na juventude costuma haver uma relativa cegueira para com os bens espirituais. Nesse sentido, a situação da juventude piora muitíssimo a partir da década de 60, com o advento da chamada Revolução Sexual, em maio de 1968, quando então numerosos jovens, em vários países do Ocidente, como a França e os Estados Unidos, estavam por dar início a uma ação política ampla à qual haviam sido já dispostos, como marionetes, por intelectuais revolucionários que sabiam muito bem o que estavam fazendo.  

Os jovens, como massa de manobra, atacando sua consciência e perdendo todo freio moral, então questionaram orgulhosamente a moral sexual tradicional com falsas ideias e uma atitude conforme a seus devaneios libertinos, a qual deu origem a uma onda social de luxúria. Na referida década, a propósito, quando foram criados os anticoncepcionais – cujo uso é pecaminoso e supõe risco de aborto! –, o Papa Paulo VI levantou-se contra este caos luciferino por meio da sua encíclica Humanae Vitae. Ora, a consciência da sacralidade da vida humana e da família como realidade querida por Deus e o respeito devido a estas verdades sempre foram fundamentais para uma boa formação espiritual desde a infância.  

Pois bem, temos então que o jovem é inclinado a satisfazer às suas paixões, que são veementes, e sobretudo às relacionadas ao sexo, tendo por impedimento a isto a lei moral cristã, baseada nas leis natural e sobrenatural (sendo esta a que nos foi revelada). Por sua inclinação natural à rebeldia, unida às máximas mundanas, cada vez mais arraigadas na sociedade, encontra terreno propício para desvincular-se de toda norma moral nestas ideias revolucionárias, que estão presentes no conjunto da sociedade contemporânea. 

Daí que, vendo-se ao mesmo tempo mais livres para entregar-se aos prazeres da sexualidade sem assumir quaisquer responsabilidades e como que obrigados a isto pela opressão que o mundo faz àqueles que não se lhe submetem, ainda que sejam do mundo, a luxúria se tenha tornado simultaneamente uma falsa fonte de felicidade sempre aberta e disponível e um meio de rebelar-se contra a repressão, como diriam Freud e seus discípulos, da sexualidade humana.  

E a que tudo isto está vinculado essencialmente, senão a uma noção de progresso contínuo, de superação de épocas de menos liberdade e mais rigor, coisas tão contrárias à natureza expansiva dos homens? São tempos novos, costumam dizer, e não existe verdade absolutao que importa é ser feliz, independentemente de como; devemos supostamente respeitar todas as maneiras de buscar a felicidade – exceto, é claro, a concepção de que tudo isto é falso, que deve ser atacada de todas as formas, com o uso de mentiras, calúnias e falácias…  

Ora, que instituição ao longo dos séculos representa, para essa mentalidade revolucionária, um entrave mais robusto e impávido do que a Santa Igreja Católica, cuja virtude de ser disto capaz provém do Espírito Santo? Por conseguinte, há que combater a Igreja, com seus dogmas fixosantigos, e seus ensinamentos morais inalienáveis imutáveis sobre a sexualidade e a liberdade humana. E combatem-na precisamente por meio de calúnias, falsidades históricas propositadamente disseminadas, espantalhos e tutti quanti.  

O jovem se moverá então num mundo essencialmente inimigo da Igreja, além de por natureza ver na moral católica uma diminuição da sua liberdade, quer por experiência própria, quer por infusão de ideias desde o todo social. Ela parecerá, portanto, uma firme oposição à sua felicidade, ou pelo menos uma realidade nada concernente a si mesmo, que nada lhe pode oferecer de bom. 

É certo que o mundo sempre foi exímio corruptor da juventude e que esta, por sua vez, nunca esteve livre das suas debilidades próprias, ainda nas sociedades mais cristãs, porém nunca tanto como hoje houve tanta busca de serem legitimadas e defendidas jurídica e socialmente as desordens mais perversas. 

Uma das mais patentes é a seguinte. A mentalidade reinante da época em que vivemos não apenas julga o aborto, que é um crime de assassinato, como algo lícito como o fomenta sistematicamente e combate quem se opõe à sua prática e legalização, enquanto, ao mesmo tempo, se sente extremamente ofendida quando alguém se levanta contra as suas ideias doentias com argumentos sérios e plausíveis, invocando contra estes a liberdade de pensamento e a necessidade de respeitar ideias, ainda as mais imorais e satânicas. Estamos cercados de ideologias, distorções da realidade, falácias, politização de todas as ordens da vida humana e, enfim, ateísmo.  

E nesse contexto há muitos católicos que se deixam levar por estes filhos do mundo e misturam com joio o trigo limpo da santa doutrina, já não distinguindo mais entre o que é católico e o que é absolutamente incompatível com sê-lo, pois não se trata aqui de se terem meramente opiniões pessoais periféricas sobre assuntos sem importância, mas de se conservarem ou não vivos a virtude teologal da fé e o estado de graça, sem o qual ninguém pode, após esta vida, ser salvo.  

O suposto perigo de uma ordem que se mantenha íntegra na proclamação e defesa da Verdade, fazendo exclusão de todo interesse político vão, faz que os jovens, sentindo, pelas influências do mundo, sua liberdade ameaçada e chamados a uma grande causa na qual poderão dar livre espaço à expansão da sua natural rebeldia por meio de uma luta, de um combate no qual aliarão ao seu desejo de um “mundo melhor” um apoio grupal próprio de indivíduos imaturos e inseguros, este “perigo”, dizia, faz que eles se coloquem em posição de batalha para, unidos à massa da qual fazem parte, combaterem a Igreja. Quantas feministas não vemos fazendo isto, por exemplo? É o feminismo moral, lícito, legítimo, verdadeiro? E quantos ditos católicos ainda têm a audácia de trair a Santa Igreja defendendo uma ideologia anticatólica e subversiva?  

Este é um quadro bastante resumido de alguns dos instrumentos mediante os quais o mundo perverte as almas, particularmente os jovens, para os quais a opinião do meio cuja aprovação desejam é importantíssima, tanto que buscam acomodar-se a ela em detrimento de valores fundamentais. É esta ou aquela festa mundana, na qual há excesso de comer e beber (sobretudo álcool), músicas imorais, vestes milimetricamente pensadas para atrair o apetite sexual uns dos outros, etc..  

Em suma, por respeito humano de início, e depois por adesão voluntária e algo consciente, os jovens tornam-se escravos do mundo em nome de uma suposta liberdade absoluta e assim, no mínimo, afastam-se da Igreja, quando não se tornam definitivamente ateístas e incrédulos confessos e militantes.  

2. Reflexões finais sobre a juventude: esperança, desespero e eternidade 

Nós vivemos em uma época profundamente marcada pelo desespero porque caracterizada pelo esquecimento e desprezo, conscientes ou não, das realidades espirituais. Indubitavelmente, não poderia ser de outro modo: a quem não tem o que esperar para além das incertas vicissitudes desta vida perecível nada resta senão apegar-se neurótica e lamentavelmente, com uma atitude metafisicamente doentia, às ninharias que ela oferece. 

Em uma linguagem mais filosófica, dir-se-ia que o homem, ser essencialmente aberto para o aperfeiçoamento de si mediante o contato com perfeições externas e internas, todas fundamentadas no Ser supremo e absolutamente perfeito e, portanto, feliz, o qual é Deus mesmo, é dotado inexoravelmente duma potência que não resiste ao impacto do bem que o pode tornar mais perfeito e assim se lhe apresenta: sente logo a necessidade de haurir dele o necessário para a saciar a sua sede de existência, ou melhor, de maior consistência ontológica. 

Esse motor, que se chama vontade, como está continuamente buscando mais e mais bens, também está, conseqüentemente, de contínuo sem a posse de outros tantos, ausência que, em presença de um desejo correspondente, gera, dadas certas condições, um desejo, ou melhor, uma esperança, quando a posse do bem desejado é avaliada como algo árduo, difícil de obter-se. 

Ora, uma fonte de contínua e insaciável esperança – insaciável em face dos bens desta vida –, ao chocar-se com a debilidade essencial da figura deste mundo, logo se vê sufocada em seu ímpeto nos corações minimamente sensatos e sinceros: chegará um momento em que não será possível esperar por outra coisa – quando se perdem de vista os bens espirituais – que não uma ínfima prolongação da vida por meio da qual se possam esperar outros bens e sua respectiva fruição. Um engano atrás do outro, como se vê, e uma estrutura fadada ao fracasso desde o início, porque sujeita à morte.  

Dito de outro modo, nossa época, enquanto alheia aos bens espirituais e apegada à materialidade por si mesma, como suposto manancial de felicidade, carrega em si um desespero latente e estruturante psicológica e socialmente, porque tudo o que pode esperar está sujeito a incertezas e é inevitavelmente esmagado pela supressão da vida que é condição a que se desfrutem as pequenas alegrias contidas no repertório de bens esperáveis. 

O cume da esperança falsa dos sequazes do materialismo como modo de vida e concepção de mundo é a absorção dos numerosos bens passageiros que se esperam nas fases iniciais da vida, e quem sabe mesmo na velhice, mas que se esfarelarão necessariamente. Aqui, a juventude aparece como a fase em que há mais o que se esperar, como é natural, porque tem-se uma vida inteira pela frente e existe uma multidão indefinida de bens não possuídos e sonhos não realizados.  

Dada, porém, a natureza duma esperança radicada somente em bens temporais, pode-se dizer que ela é tão volúvel quanto estes, de forma que, faltando-lhos, ela não se dirige vitalmente a outros horizontes, não transcende a si mesma nem faz o homem perpassar esta vida qual um peregrino em direção à eternidade, senão que é, pelo contrário atingida mortalmente e tragicamente pelo raio da morte e dos inevitáveis desenganos que todos acabam por experienciar amargamente.  

Assim, como a fonte de gerar novos objetos de esperança é ilimitada e aponta à eternidade, quando estes objetos de esperança são todos temporais, haverá um desespero real concernente ao ilimitado e à eternidade, enquanto sentimentos e atos de esperança voltados ao domínio do material absolutizado, que necessariamente será perecível e com o passar dos anos diminuirá seu influxo sobre a vontade quando as forças do homem em idade avançada, já desiludido e exausto de tantas superfluidades, não mais se entusiasmarem com as promessas de felicidade deste ou daquele bem agradável, deleitável, faustoso.  

É possível, então, e nada raro, que um indivíduo esteja alegre, esperançoso, confiante e repleto de projetos para o futuro enquanto simultaneamente a isto padece de um profundo desespero, literalmente, que não necessariamente será uma paixão atual, um estado anímico consciente e perturbador, senão mais precisamente uma atitude existencial habitual, o que é ainda mais grave de certo modo.  

Esta é uma brevíssima descrição do que seja o desespero de que padece nosso tempo. Não se espera hoje senão o que trai o coração, o que é infiel às promessas de felicidade que expõe no seu seio com tanto ardor, e o que se rejeita é precisamente o que vale a pena esperar porque consoante aos anseios mais profundos do coração e porque não decepciona.

Por que razão sólida esperar ansiosamente por vãos fantasmas, por quiméricos movimentos de ar que vêm até nós e esfumaçam-se antes mesmo que os desfrutemos ou os sintamos devidamente, quando podemos abraçar-nos ao infinito? Por que esperar bens da promessa de um criminoso sem escrúpulos e perverso quando um Pai bondoso nos promete um inefável bem cujas delícias podemos como que saborear antecipadamente tão logo nos rendemos a Ele? Por insensatez diabólica, talvez? Rigorosamente falando, trata-se de astúcia diabólica: Satanás, príncipe deste mundo, bem sabe como fazer o homem gozar falsamente dum ilusório Éden cá na terra precisamente quando criou em sua própria alma um ambiente essencialmente infernal e desesperador, e isto na maior das cegueiras, supondo-se feliz! 

Mas que intenciono dizer com tudo isto? É que a nossa época cultua a juventude e incentiva-a a aproveitar a vida precisamente porque padece deste desespero metafísico tão arraigado, do qual venho tratando. Se a vida é breve e nossa felicidade está restrita a seus paupérrimos limites, o seu florescer deve ser bem usado em favor da aquisição de todos os bens que se têm à disposição como fonte de felicidade e aperfeiçoamento, aqui ditos mundanos, fixando-se no horizonte dos breves espaços de tempo que são dados a cada alma a viver.  

E, como depois que o indivíduo fica velho – é assim que se pensa hoje – já não terá as mesmas forças nem oportunidades de gozar e desfrutar da vida, a juventude é o momento certo de fazer isto, de viver com intensidade, lutando contra o tempo, pois tudo o que vivemos só é vivido uma vez, é irrepetível no pior sentido da palavra e depois não pode tornar a ser senão no triste e noturno lago da memória, que também se verá logo submerso, mais gravemente porém, no abismo do nada, já que nada há que ao nada não retorne para os vassalos deste mundo. 

Pois bem, aparentemente, então, há apenas uma juventude porque um só é o futuro existente, o futuro que move as potências da esperança e fazem o jovem sonhar e mover-se em direção a ele. Depois, a esperança vai morrendo aos poucos, porque têm-se um futuro menor – aproxima-se a morte – e os sonhos já alcançados, tornados passados. Decrescem proporcionalmente entre si a juventude e a esperança, portanto.  

E por quê? Precisamente porque o instante presente não foi vivido em conformidade com um futuro mais sublime, um futuro imperecível que é mais instante atual ou presente do que o próprio agora: a eternidade. Dir-se-ia, com mais precisão, que o fundamento último da existência de algo como a esperança no homem é a possibilidade real de dirigir-se à eternidade como critério de toda escolha temporal.  

Enquanto há vida, mas os desejos são mundanos, a esperança diminui na medida em que o homem é incapaz de ser um eterno gozador insensato; contudo, enquanto a esperança do homem está dirigida à vida eterna, até os segundos finais de uma existência individual tornam-se repletos de esperança, por este futuro imperecível que não é corroído pela morte nem treme diante de sua proximidade.  

Ora, não é verdade que a juventude é caracterizada pela esperança, pelo seu vigor de lançar-se a esta realidade chamada futuro para buscar realizar seus sonhos? Se é assim, a esperança sobrenatural, uma das três virtudes teologais, é a única força operativa capaz de tornar um idoso à beira da morte semelhante a uma criança a lançar-se alegremente à imensidão dum campo florido, em tempo primaveril, a brincar com os seus.  

Dito de outro modo, ela é capaz de dar a este idoso um futuro estável imenso diante de seus olhos, iluminados pela fé teologal, algo por que esperar com todo o ardor de seu coração, ardor que nos recorda a liberdade sublime dos Santos, daqueles que, desapegados de todas as coisas desta vida, só almejavam unir-se a Deus definitivamente nos céus.  

Nesse sentido pode-se dizer com toda a tranquilidade que nos Santos transparece a verdadeira e mais legítima juventude, uma vez que seus corações se lançavam impetuosamente da terra – desta vida temporal – à contemplação amorosa e esperante dos bens celestiais, ou seja, eram qual corações de águia a voar pelas alturas do céu da caridade – Sursum corda

Eis a verdadeira juventude, da qual a natural é apenas uma suave disposição a receber as graças fecundantes do Espírito Santo a que se dê sua real elevação, sua mais digna coroação. É isto o que, de algum modo, promete a juventude natural em sua essência: permitir-se ornar-se e elevar-se pelas dádivas divinas da graça habitual, da santificação efetiva e real, da glória divina manifestada numa vida reta e inundada de caridade a Deus.  

O Beato Carlo Acutis é um exemplo formidável disto que se está querendo expor aqui. Ninguém tão livre, ninguém tão jovial, ninguém tão fervoroso e virtuoso no seu entorno – ele viveu eficazmente a profunda e verdadeira juventude dos Santos, e não um apego desordenado a bens falsos e perecíveis, sem reta ordenação a Deus.  

Portanto, se a juventude exprime o vigor do homem caminhante em direção à eternidade e até esta mesma, a seu modo, como vimos, caso nela não se realize o que ela mesma promete ao fazê-lo tão bem, seu único adorno será a marca da vivência de uma relativa mentira existencial, e na medida em que sua promessa não se cumpre, torna-se réu de infidelidade também existencial. 

Eis, finalmente, exposta fugazmente a beleza da juventude, beleza espiritual, advinda do desígnio da Sabedoria divina a seu respeito. Nada tão distante como um culto desordenado e mundano devotado doentiamente a esta fase da vida, ou uma atenção dada a ela com fim ideológico, fazendo dela uma espécie de classe, um grupo social a que supostamente defender contra sabe-se lá quem, porém nunca contra si mesma nem contra o mundo, do qual os ideólogos de todos os tempos sabem fazer parte tão impiamente e movidos pela chamada prudência da carne, conforme expressão do Apóstolo. 

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