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[Sermão] Sou feliz por ser católico? – Pe. Ivan Chudzik, IBP

Padre Ivan Chudzik - Sou feliz por ser católico?
Por Padre Ivan Chudzik, Instituto Bom Pastor

Nosso Senhor diz no Evangelho da missa: “Bem-aventurado sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim”.

Essa bem-aventurança, caros fiéis, para os nossos olhos tão pouco espirituais, nos causa naturalmente um sentimento de temor. Temos a impressão que seguir Nosso Senhor é um fardo muito pesado, repleto de sofrimentos, perseguições, injustiças; que somente um número muito pequeno de almas seria capaz de suportar. Por isso, muitas vezes temos medo do progresso espiritual, porque temos a impressão que quanto mais progredirmos, mais sofrimento deveremos suportar.

No entanto, trata-se de um engano, porque no versículo seguinte, Nosso Senhor acrescenta: “Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa no céu”. Em outras palavras, nós devemos nos alegrar já nesta vida, já neste mundo, pela recompensa que nos será concedida na vida eterna. O bom católico não vive apenas na expectativa da felicidade do céu, ele se alegra desde esta vida, desde este mundo, por praticar os mandamentos e viver segundo a vontade de Deus.

Essa alegria cristã no cumprimento dos mandamentos, especialmente quando os mandamentos incluem algum sofrimento, alguma renúncia, alguma privação, enfim, essa alegria cristã no cumprimento dos mandamentos, parece ser uma realidade distante da nossa vida. Na verdade, muitas vezes nós experimentamos o contrário. O cumprimento dos mandamentos não parece oferecer recompensa nenhuma nessa vida. Muitas vezes nós cumprimos os mandamentos movidos mais por temor dos castigos do que por desejo de uma alegria genuinamente espiritual.

Em resumo, apesar da promessa de Nosso Senhor, nós nem sempre conseguimos encontrar um motivo de alegria sobrenatural com todo o sofrimento e perseguição que devemos suportar quando cumprimos os mandamentos. Parece-nos que, nesta vida, não há nenhuma recompensa, apenas a certeza de que deveremos sofrer bastante e por longo tempo.

Uma das principais causas para que nós tenhamos essa falsa impressão de que a procura da felicidade e o cumprimento dos mandamentos são coisas distintas, uma das principais causas dessa separação, dessa divisão, é uma má doutrina surgida no século XVII, que afetou muitas gerações de teólogos católicos. Para essa má doutrina, nossas boas ações, nossas ações virtuosas, deveriam ser gratuitas, ou seja, sem nenhum interesse por recompensa. Pois, para essa má doutrina, todo interesse por uma recompensa, todo interesse por uma felicidade pessoal, seria nada mais do que egoísmo.

Portanto, segundo essa má doutrina, para que nossas ações sejam virtuosas, para que não sejam egoístas e sim virtuosas, não deveríamos desejar nenhuma recompensa, nenhuma felicidade pessoal. Para essa má doutrina, nossas boas ações deveriam ser puramente gratuitas, absolutamente desinteressadas, e somente assim seriam boas.

Isso significa, caros fiéis, que quando alguém se propõe a praticar as virtudes, excluindo todo o interesse por recompensa ou felicidade pessoal, esse alguém pratica as virtudes unicamente por dever. Ou seja, segundo essa mentalidade, que não é católica, para que uma boa ação não seja egoísta, ela deveria ser praticada unicamente por dever, e não em vista da própria felicidade.

A consequência desse erro, quando aplicado na teologia moral, é que a teologia moral deixa de ser a sublime ciência do amor a Deus para se reduzir a um código de conduta, a um manual de conduta que ensina quais seriam os nossos deveres, mas que pouco teria a dizer sobre a nossa felicidade, ou seja, sobre o desejo que Deus infundiu em nossa natureza para nossa felicidade eterna no céu.

Quando a teologia moral se reduz a um código de conduta, a um manual de conduta que ensina quais seriam os nossos deveres, mas que pouco teria a dizer sobre a nossa própria felicidade, nós entramos num conflito, numa oposição entre a lei moral e a liberdade humana.

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Esse conflito entre a lei moral e a nossa liberdade ocorre porque, de um lado, está a lei moral da Igreja, que impõe quais são os nossos deveres, enquanto que do outro lado está a nossa liberdade, que procuramos usar para cumprir o estrito necessário da lei, a fim de evitar o pecado, mas nas demais coisas a usamos para procurar a nossa própria felicidade nessa vida por meio das consolações sensíveis.

Na verdade, ainda que jamais tenhamos pensado nisso, nós vivemos assim. A maioria de nós vive assim. Na prática, caros fiéis, nós separamos a lei moral e a liberdade. Na prática, nós separamos o cumprimento dos nossos deveres e a busca livre da nossa própria felicidade.

Por exemplo, basta considerar que muitos católicos procuram assistir à missa apenas aos domingos e dias santos, porque apenas nesses dias a missa é de preceito, ou seja, apenas nesses dias há um dever de assistir à missa. Nos demais dias, não havendo nenhum dever, esses católicos procuram guardar o seu tempo para si, investindo naquilo que eles julgam mais oportuno para encontrar a própria felicidade. Em outras palavras, para muitos católicos, está fora de questão procurar assistir à missa mais vezes na semana, dentro das próprias possibilidades, simplesmente porque a missa durante a semana não é um dever.

Outro exemplo: o estudo da doutrina católica. Muitos católicos não se importam em estudar a doutrina católica, simplesmente porque eles não estão inscritos nem na catequese da primeira comunhão, nem na catequese do crisma, ou seja, eles não se sentem obrigados a estudar. Para eles não existe o dever de aprofundar os seus conhecimentos de doutrina católica. Em outras palavras, esses católicos se consideram livres para empregar o seu tempo, a fim de procurar o próprio lazer, o próprio entretenimento, porque não existe nenhuma obrigação, nenhum mandamento, que os obrigue a conhecer a doutrina para além daquilo que já aprenderam na catequese da infância e da adolescência.

Um último exemplo: a abstinência de carne às sextas-feiras do ano. Muitos católicos sequer cogitam a possibilidade de fazer mais vezes ao longo do ano alguma penitência voluntária, por exemplo, a quaresma de São Miguel. E muitas vezes comutam a abstinência de carne por qualquer outra obra de misericórdia quando não se sentem dispostos a fazer aquele sacrifício, aproveitando-se assim dessa liberdade que a norma atual permite.

Em outras palavras, muitos católicos cumprem apenas o estrito necessário do dever e não se sentem na necessidade de praticar mais vezes a mortificação, simplesmente porque não existe nenhuma obrigação, nenhum mandamento, que os obrigue a fazer mais penitência do que o pouco que costumam fazer.

E assim, caros fiéis, em cada um desses exemplos, nós vemos na prática uma separação entre a lei moral e a liberdade. Por um lado, nós cumprimos a lei moral porque é um dever, é algo que deve ser feito sob pena de pecado e sob pena da nossa condenação. Por outro lado, a nossa liberdade começa quando termina a nossa obrigação, quando terminam os nossos deveres. Além disso, nós empregamos essa liberdade para procurar nesta vida a nossa felicidade por meio das consolações sensíveis.

Ora, essa mentalidade nada católica, mas que se infiltrou na teologia católica há vários séculos, nos conduz a uma conclusão inevitável: um católico imbuído dessa mentalidade tem a tendência a considerar os seus deveres morais como um obstáculo para o uso pleno da sua liberdade e a realização da sua felicidade. Mais ainda, a tendência desse católico é, sobretudo, de cair numa certa frustração, num certo desânimo no cumprimento dos seus deveres morais, porque tais deveres parecem oprimir, parecem pressionar a sua natureza humana e a sua liberdade. Em outras palavras, se não fosse a lei moral, se não fosse os mandamentos, nós seríamos ainda mais livres e poderíamos buscar ainda mais prazer nesta vida.

É por causa dessa mentalidade péssima que surge uma divisão e praticamente uma disputa entre os católicos. De um lado estão os rigoristas, isto é, aqueles católicos que têm uma certa facilidade para cumprir os deveres morais, que têm mais disciplina de vida, e são partidários de um aumento na carga de obrigações de um católico, por exemplo, defendendo a obrigatoriedade das disciplinas antigas do jejum quaresmal ou do jejum eucarístico. Do outro lado estão os liberais, isto é, aqueles católicos que têm uma maior compaixão para com o próximo, considerando as dificuldades da maioria dos católicos para praticar os deveres morais, e por isso são partidários de uma diminuição na carga de obrigações de um católico, por exemplo, defendendo o que podemos fazer livremente a comutação da abstinência de carne às sextas-feiras, ou que podemos cumprir o preceito dominical na missa vespertina de sábado, uma vez que atualmente isso é permitido.

Ora, essa disputa entre rigoristas e liberais não faz o menor sentido. Enquanto cada partido procura provar que o seu lado é o mais justo, na verdade, os dois partidos são duas faces do mesmo erro. O erro de separar a lei moral da nossa felicidade. O erro de compreender a lei moral como algo contrário à nossa liberdade pessoal, à nossa felicidade pessoal.

Agora, qual é a solução para o nosso conflito? Para resolver esse conflito, nós precisamos retornar ao erro que está no princípio de todos esses equívocos. Não nos esqueçamos que, segundo uma má doutrina, uma ação seria boa e virtuosa somente quando ela fosse gratuita, ou seja, quando não houvesse nenhum interesse por recompensa, quando não houvesse nenhuma busca por uma felicidade pessoal. Em outras palavras, segundo essa má doutrina, para que uma ação fosse boa e virtuosa, nós deveríamos fazê-la por mera obrigação, sem visar nela a nossa felicidade pessoal.

Este é o erro, caros fiéis, o erro de separar os mandamentos e a nossa felicidade. O erro de procurar a própria felicidade fora dos nossos deveres morais e de cumprir os mandamentos por mera obrigação e nada mais, apenas para evitar o pecado e a condenação eterna.

Isso significa que a solução para esse problema, a solução católica, consiste justamente em unir os mandamentos e a nossa felicidade pessoal, porque é justamente a lei divina que pode nos fazer plenamente felizes. Não apenas na eternidade, mas já nesta vida. Na verdade, nós não devemos procurar a nossa felicidade fora dos mandamentos e fora das virtudes, porque nós cumprimos os mandamentos e praticamos as virtudes justamente para remover o nosso fundo de orgulho, o nosso egoísmo, e assim participar da própria bondade de Deus, que é o sumo bem. Portanto, os mandamentos e as virtudes não são regras arbitrárias, não são meras formalidades, não são meros deveres, mas sim o itinerário da nossa felicidade, porque por meio dos mandamentos e das virtudes, nós renunciamos ao nosso fundo de orgulho e participamos da bondade do próprio Deus, que é o sumo bem.

Quanto mais nós avançamos no cumprimento dos mandamentos e na prática das virtudes, mais nós somos transfigurados pela caridade, mais o fogo da caridade nos devora e nos torna mais semelhantes ao próprio Deus. Isso quer dizer que, quanto mais amamos a Deus, mais nós somos transfigurados pelo próprio Deus, e mais nós encontramos na posse do sumo bem a nossa própria felicidade.

Se não compreendermos que a nossa felicidade consiste no cumprimento dos mandamentos e na prática das virtudes, então a nossa vida católica será sempre um fardo, pois ainda somos escravos das desordens das nossas paixões, ainda estamos cegos de orgulho, e por isso cumprimos o estrito necessário dos mandamentos e das virtudes para procurar uma pretensa felicidade fora dos nossos deveres morais.

Além disso, não é raro que procuremos cometer deliberadamente pecados graves com uma certa frequência, pois não conseguimos viver nossa vida longe de certas desordens, especialmente contra o sexto mandamento, isto é, contra a castidade.

Criamos assim uma dualidade em nossa vida espiritual. Queremos morrer confortados pelos sacramentos e revestidos do escapulário, mas aceitamos viver os nossos dias num vai e vem entre o estado de graça e o estado de pecado, porque não nos sentimos plenamente felizes cumprindo os mandamentos e praticando as virtudes.

Então saibamos bem, caros fiéis, que nós nunca nos curaremos das quedas frequentes nos pecados graves, especialmente nos pecados contra o sexto mandamento, contra a castidade, enquanto não nos convencermos, com a luz da graça, que somente a virtude pode nos fazer plenamente felizes, porque é a virtude que nos torna semelhantes a Deus já nesta vida. É a virtude que nos faz participar da bondade do próprio Deus já nesta vida.

Portanto, é necessário combater o nosso fundo de orgulho, o nosso amor próprio desordenado, as nossas paixões desordenadas. Isso quer dizer que não é a virtude que nos torna infelizes ou frustrados, mas sim a nossa falta de constância na virtude. Essa falta de constância faz com que o retorno para a virtude seja sempre penoso, seja sempre difícil, seja sempre custoso, como no caso de uma construção na qual os pedreiros assentam os tijolos durante o dia e removem durante a noite. O trabalho dessa construção, em vez de diminuir dia após dia, só aumenta, porque é necessário recomeçar sempre de novo, todos os dias.

Portanto, caros fiéis, saibamos encontrar na nossa vida católica a nossa plena felicidade. Como diz o Salmista, “os preceitos do Senhor são retos, deleitam o coração. O mandamento do Senhor é luminoso, esclarece os olhos”. Sem isso, sem pensar na nossa própria felicidade, sem considerar que os mandamentos e as virtudes são o nosso único caminho para a felicidade, nós vagaremos sempre pelo mundo, procurando nos vícios o que não soubemos encontrar na virtude.

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Sermão para a solenidade externa de todos os Santos (03/11/2024)
Pe. Ivan Chudzik, IBP
Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, Belém/PA

Vídeo do Sermão

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