A respeito das últimas discussões envolvendo membros do Centro Dom Bosco, o Prof. Carlos Nougué e o Psiquiatra Ítalo Marsili, o amigo Augusto Pola ponderou: “Ora, o estudo, pela humildade, deveria aumentar a capacidade da alma realizar distinções, permitindo maior clareza e questionamento de cuja resposta virá o esclarecimento. A soberba, por outro lado, vai pela via do carteiraço e ao invés de clareza e tranquilidade, carrega considerações baseadas em raciocínio torto de non sequitur.“
Achei perfeita a sua colocação e ela me motivou a escrever algo a respeito dessa barafunda sem me embrenhar, contudo, no mérito da espinhosa questão que a originou, ou opinar sobre os motivos alegados pelos debatedores. Quero atentar, isto sim, para algo que infelizmente tem faltado nesses debates.
É muito estranho que alguém possa jactar-se de uma vida de estudos profundos e experiências clínicas numerosas, bem como de uma fiel rotina de orações e meditações, mas não apresente certas virtudes básicas que geralmente derivam de uma vida sábia, experiente e piedosa.
A oração acompanhada do estudo honesto deveria incutir, naturalmente, uma consideração mais modesta de si mesmo, refrear os ímpetos de narcisismo e vanglória dos próprios feitos, bem como pacificar a língua e evitar o escândalo sempre que possível. (Nosso Senhor foi claro ao nos advertir sobre a gravidade dos escândalos e das injustas ofensas feita ao próximo.)
Porém, se o que se vê é o oposto, há algo de muito errado. Talvez se pense que as boas obras de misericórdia corporal praticadas em âmbitos específicos dispensam da observância de virtudes consideradas, talvez, menos importantes, quando o fato de serem mais comezinhas não lhes tiram em nada a importância na aquisição da verdadeira caridade.
Ao contrário, elas são um pressuposto básico, mínimo, para alguém que se pretenda cristão, e ainda mais para alguém que tenha um manifesto poder de influência sobre muitas outras almas. São Paulo Apóstolo exorta sobre essas virtudes em diversas passagens. Vejamos uma delas:
Foge das paixões da mocidade, busca com empenho a justiça, a fé, a caridade, a paz, com aqueles que invocam o Senhor com pureza de coração. Rejeita as discussões tolas e absurdas, visto que geram contendas. Não convém a um servo do Senhor altercar; bem ao contrário, seja ele condescendente com todos, capaz de ensinar, paciente em suportar os males. É com brandura que deve corrigir os adversários, na esperança de que Deus lhes conceda o arrependimento e o conhecimento da verdade, e voltem a si, uma vez livres dos laços do demônio, que os mantém cativos e submetidos aos seus caprichos.” (Segunda Epístola a Timóteo II, 22ss)
Na sua bela peça catequética chamada Ordo Virtutum, a doutora Santa Hildegarda de Bingen louva a humildade como a rainha das virtudes e canta magnificamente a sua excelência. Mas por que esta virtude tão fundamental anda tão desprezada, inclusive por alguns dos mais proeminentes influencers cristãos dos nossos dias?
O cristão bem ordenado, quando seguido em seus pareceres por um grande número de outras pessoas, se preocupa, no que concerne aos seus semelhantes que o ouvem e consideram seriamente, em reuni-los em Cristo e ensinar-lhes o que é seguro, instruir no que é reto, pacificar e salvar. Ele se responsabiliza pelo poder da suas palavras e se reconhece como um (tipo de) pastor de almas; por conta disso, procura não se deixar dominar pelas arrogâncias e paixões do ego, mas evita, por todos os meios possíveis, dar mau exemplo, gerar escândalo (Ai de nós!), alimentar discussões inúteis e corromper por palavras mal ditas ou que possam ser mal compreendidas.
O soberbo influente, por outro lado, ostenta e se vangloria da própria audiência, dos próprios feitos e das suas aquisições intelectuais ou materiais (riquezas), se envaidece com os méritos que atribui a si próprio (quando deveria escondê-los e deixar que apenas Deus os conhecesse), não evita ser uma má influência nos vícios que considera de pouca monta, causa divisões destrutivas, gera escândalos desnecessários, despreza as virtudes mais banais no trato com os semelhantes, mas ainda assim considera-se mais sábio e merecedor de reconhecimentos e louvores do que todos os que o questionam.
Alguma vez já se viu na terra um verdadeiro santo, um homem de fato temente a Deus, que procedesse assim? Podemos imaginar algum deles, mesmo os mais insignes doutores, vangloriando-se de seus saberes e obras, enaltecendo-se disto e daquilo, e espezinhando os seus opositores com um palavrório indigno?
Rezemos por aqueles que, embora se apresentem como católicos observantes, fazem pouco caso do exemplo dos santos que o precederam, expressam-se frequentemente com a audácia dos que não conhecem a Cristo e se arvoram em mestres do nosso tempo.