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Lutero e a Crise do Mundo Moderno

Palestra: Lutero e a Crise do Mundo Moderno

Tendo como base o capítulo “As Primeiras Rupturas” do livro “A Crise do Mundo Moderno” do Padre Leonel Franca, nesta palestra explicou-se de que modo as idéias de Lutero plantaram os embriões da crise de nossa civilização no campo da Teologia e da Filosofia.

Quadro da Palestra "Lutero e a Crise do Mundo Moderno"

Nesta palestra, vamos tratar do primeiro capítulo da segunda parte do livro FRANCA, Leonel. A Crise do Mundo Moderno, Editora Santo Atanásio, 2019 pp. 74-85. [Link para a loja].

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Para não pular assunto, vamos falar brevemente sobre a primeira parte do livro. Nela o Padre Leonel Franca fez todo um estudo de Filosofia da Civilização, chegando a conclusão de que uma civilização possui suas preocupações temporais (instituições, educação das famílias, demais projetos, etc) e, sobretudo, suas preocupações metafísicas que envolve a idéia que tal civilização tem de pessoa e de mundo. Deste modo, a sociedade em geral, a partir da idéia que tem de pessoa, sobre o que é o homem, e a partir da idéia que tem sobre a finalidade de estar neste mundo, é que vai moldar o espírito desta civilização. Sendo assim, uma civilização entra em crise quando sua visão de homem e de mundo estão capengas, afastadas da realidade, seja por um materialismo coletivista, seja por um individualismo exacerbado.

Para o Padre Leonel Franca, Lutero foi o grande pai da Crise do Mundo Moderno. Não que ele tenha feito isso sozinho, pois, para ser justo, Lutero já era uma pessoa típica de seu tempo, já estava contaminado de filosofia nominalista, que nega a metafísica. Todavia, a paternidade da crise é atribuída a Lutero, porque ele teve o mérito de propagar a consequência dessas idéias pela via da religião. Ora, se uma civilização se transforma conforme se mude sua visão de homem e de mundo, o que tem o poder para operar tal tipo transformação sobre essas visões – dirá o Padre Leonel Franca – não é outra coisa senão a religião. Pode-se aqui se objetar que a filosofia teria esta capacidade, mas a isso o Padre Leonel rebate dizendo que é justamente a filosofia que se torna religião, uma vez que passa a ser popularizada pelos mais diversos canais culturais da sociedade (mídias, livros, teatros, educação, etc). Se não fosse assim, as filosofias seriam doutrinas conhecidas de poucos acadêmicos e não teria tamanha influência na transformação social. Portanto, se a religião é a grande propagadora de mudanças sociais, aí está o grande mérito do luteranismo em ter sido a grande causa da ruptura que gestou a modernidade e as demais ramificações geradoras de crise.

Entendamos, pois, como a teologia luterana gerou o incêndio da ruptura moderna:

“As relações entre a natureza e a graça constituem o centro de gravidade da teologia luterana” (p. 74)

Na concepção católica, a graça pressupõe a natureza, purificando-a e elevando-a ao sobrenatural. Já Lutero tinha uma visão pessimista do homem, uma concepção pessimista da natureza humana: a razão seria incapaz de encaminhar a alma à fé; a vontade estaria escravizada pelo mal: fatalismo.

Tal diferença é devida à interpretação sobre a queda do homem pelo Pecado Original. Para o catolicismo, o homem decaiu, perdeu a vida da graça e teve sua natureza debilitada, mas não completamente rompida. O homem ainda conseguiria, ordenando suas paixões para as virtudes, através da razão e da vontade, conhecer e praticar o bem, desenvolvendo assim a sua personalidade, mesmo que a muito custo. Após a redenção obtida por Cristo na Cruz, a graça vem justamente em auxílio do homem para purificá-lo dessa debilidade da natureza manchada pelo pecado e elevá-lo para a vida sobrenatural, onde participa da natureza divina.

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Muito diferente é a visão luterana. O Pecado Original teria rompido definitivamente a natureza humana neste mundo, de modo que a razão, tida como prostituta do diabo, seria fonte de ilusões e não muito confiável. A vontade, por sua vez, teria sido tão enfraquecida por conta do pecado, que o homem se tornou incapaz de resistir à tentação; não seria capaz de vencer a tentação. Aqui está outra diferença essencial em relação a espiritualidade católica, onde o homem pode, justamente por conta do auxílio da graça, vencer as grandes tentações e não pecar.

Diante da trágica visão pessimista da queda, sem possibilidade da graça vir em seu socorro na vida terrena, como poderia então o homem ser salvo?

Daí que Lutero cria então a teoria da justificação pela fé. A famosa sole fidei. E aqui há outra diferença substancial para a visão católica. Para Lutero, a fé “um sentimento vivo, um impulso d’alma, uma impressão interna de ordem afetiva, confere à alma esta justificação puramente extrínseca”, isto é, somente por fora, sem mudança interior, e portanto, “a ordem sobrenatural cessa de ser uma renovação para reduzir-se a uma simples imputação jurídica de merecimentos alheios” (p. 76). Padre Leonel Franca chamará isso de uma ficção jurídica, pois, ao contrário da doutrina católica, a graça já não renova vitalmente o homem, seria apenas como que um manto colocado por cima da pessoa por causa dos méritos de Cristo, tornando-a um sepulcro caiado (bonita por fora, mas podre por dentro) na hora do julgamento.

Essa teoria da justificação pela fé tem como consequência imediata a negação da vida sobrenatural, levando a uma visão naturalista de mundo.

Contudo, a rebelião não se esgota apenas nesta queda lógica:

Excluído da Igreja, Lutero negou a Igreja; censurado pelo seu magistério infalível, recusou a infalibilidade de seu magistério. à sociedade orgânica, visível e hierárquica dos fiéis opôs, em teorias oscilantes, uma igreja invisível; contra a conservação da fé pelo órgão de um ensinamento vivo, autêntico e divinamente assistido pelo Espírito Santo, erigiu o critério individual no livre exame das Escrituras em árbitro supremo e inapelável da doutrina e da moral (p. 77).

Por sua vez, o livre-exame nega dogmas, é antissocial (pois o que vai atestar a veracidade da minha interpretação é o sentimento de fé, não a inteligência), promovendo o sentimentalismo, o individualismo.

Na filosofia, o livre-exame desencadeará paradoxalmente o racionalismo. O Lutero que tinha uma visão pessimista do homem é o mesmo que, por causa da confiança em um sentimento de Deus (fé meramente psicológica), confiará ao homem o livre-exame, fazendo-o acreditar que por ele ter pensado uma idéia, então isso significa que ela é real e correta: eis a idolatria da razão.

Bem diferente é como o católico encara a fé. A fé é a adesão de nosso intelecto às verdades reveladas por Deus. Tal adesão só é possível, porque Deus envia para nós uma graça que permite que nossa inteligência seja abraçada pela Revelação. Deste modo, é absurdo para um católico a redução da fé a mero sentimento de confiança.

Na história religiosa da humanidade, achamo-nos talvez em face de uma forma inédita de religião que vê, numa experiência subjetiva, de ordem sentimental, a garantia da própria autenticidade e o critério supremo que julga toda a doutrina (p. 78).

O raciocínio passa a ser: ‘se eu pensei, logo está correto’. Pode-se perguntar: – Mas você não pode estar errado? E a resposta será: – não, por causa do meu sentimento de confiança em Deus.

Mas o individualismo promovido pela teoria luterana não contaminou apenas o critério para o discernimento da verdade, ele também promoveu antinomias que se tornaram indissolúveis sob a clave da teologia luterana:

1) Natureza x graça: Conforme vimos, não há oposição entre natureza e graça no catolicismo. A graça aperfeiçoa a natureza e a eleva à ordem sobrenatural, onde o homem pode participar da vida divina.

2) Ciência x fé: Este preconceito de oposição entre ciência e fé está presente até os dias de hoje. Sob o ponto de vista da teoria luterna, faz sentido tal separação, pois se o critério de fé é um sentimento de confiança e o critério da ciência é a observação objetiva dos fenômenos, então elas realmente aparecem como sendo duas coisas diferentes. Todavia, a fé não é sentimento. A fé, com efeito, vem para iluminar a nossa razão, portanto, a ciência sempre confirmará a fé, haja vista que a fé provém de Deus e Deus não é contraditório com sua criação.

3) Autoridade x liberdade: Esta também é uma oposição bastante presente atualmente. Para Lutero, o fato de haver o Magistério da Igreja, a autoridade papal, enfim, toda ajuda divina que Cristo prometeu para sua Igreja, seria limitador da liberdade: a autoridade da Igreja estaria limitando o exercício do livre-exame. Não é correto o raciocínio de que porque se pode usar do livre-exame, pode-se pensar mais, e, por causa disso, seria mais livre. O que vai ocorrer na realidade é que se vai pensar mais coisas erradas. Por outro lado, o mais seguro na atividade da inteligência é partir de verdades seguras e mais corretas, não simplesmente querer caminhar sozinho e sem norte. Ora, é justamente para isso que serve a figura da autoridade, cujo objetivo é agir para aperfeiçoar nossa liberdade, dando-nos conhecimentos seguros para evitar que façamos besteiras desnecessárias. Portanto, não há posição entre autoridade e liberdade.

4) Mística x lógica: Há muito santos, por exemplo, que tentam relatar experiências místicas, e o que se percebe é que tais momentos eram inefáveis, só conseguiam alcançar alguma exatidão de descrição por certas analogias, porque não há palavras que poderia descrever. Todavia, do fato de que não se tem palavras para descrever, não significa que seja ilógico ou irracional, significa apenas que está acima das capacidades humanas para descrever. Até porque seria absurdo querer dizer que numa experiência do paraíso, por exemplo, estaria se vendo a desordem enquanto no natural eu consigo ver ordem. Ora, sabemos que não é assim, porque a lei natural não é oposta à lei eterna, mas aquela provém desta. Não há oposição, mas hierarquia: a ordem sobrenatural sustenta e pode explicar a ordem natural, mas esta não consegue explicar aquela, pois é uma realidade superior.

Eis então toda a confusão causada pela teologia luterana, que não somente distorceu a visão do homem e de sua relação com Deus (o próprio conceito de fé foi mutilado), mas também criou oposição onde há hierarquia e ordem. Não é à toa que quando tais consequências vão para a filosofia, cria-se toda uma ramificação de ideologias revolucionárias. Também não é por acaso que, no mesmo capítulo, o Padre Leonel Franca falará de Descartes como aquele que incorporou as consequências da teologia luterana e trouxe-a para a filosofia. O cartesianismo de Descartes foi a gênese filosófica mais explícita do racionalismo.

Também com Descartes achamo-nos em face de um reformador consciente que, num aprumo de individualismo isolante, se ergue contra o passado [a tradição filosófica] e arvora a pretensão de iniciar a história do pensamento”. […] O seu desejo é subministrar “a cada qual os meios de achar em si mesmo, e sem nada pedir a outrem, toda a ciência que lhe é necessária a orientação de sua vida” (p.79).

Dirá então o Padre Leonel Franca: “Bela réplica filosófica do livre exame luterano”.

Diante de uma questão filosófica, a primeira coisa a fazer é ver o status da questão, recorrendo a opinião de filósofos que já trataram sobre ela. Já Descartes propõe uma espécie de livre-exame filosófico: um método para, sem depender de ninguém, poder alcançar a verdade. Disso, dois erros salvam à vista. 1) O progresso da ciência não pode dispensar as colaborações anteriores (a famosa prudência de apoiar-se nos ombros de gigantes para poder enxergar mais longe); 2) considerar o homem como um mundo fechado que poderia chegar à perfeição sem a colaboração alheia (um exemplo claro da necessidade do outro é o dever dos pais educar os filhos).

O Padre Leonel Franca ainda falará de mais duas dilacerações causadas pela filosofia carteriana.

A primeira coisa está relacionada com sua famosa dúvida metódica. Ele colocou tudo em dúvida e, ao fazer isso, percebeu que uma dúvida ele não tinha: a que ele tinha colocado tudo em dúvida. Ora, sendo isso algo do pensamento, ele postulou o famoso princípio cartesiano: Penso, logo existo.

Todavia, como já alertava Santo Tomás de Aquino, um pequeno erro no princípio, causa um grande erro no desenvolvimento futuro.

A verdade é a adequação do intelecto à coisa, ou seja, a verdade é uma relação entre o que eu penso com o que a coisa é. Se o que estou pensando condiz com o que a coisa é, então estou na verdade. Com seu postulado cartesiano, porém, Descartes rompeu esta relação. O pressuposto do princípio cartesiano é que o critério de verdade é as idéias inatas que são claras e distintas. Mas essas idéias não partem do objeto, nem da vontade, são pura criação do espírito (idealismo). Eis o abismo entre que se criou entre o pensamento e o ser.

Nota-se aqui grande semelhança com a fé luterana. Se a idéia partir da pessoa e for acompanhada de um sentimento de certeza, então poderia ser considerada como verdadeira. Descartes, claro, não afirmava isso explicitamente, mas seu princípio já carregava tal pressuposto. Ele não negava a capacidade humana de conhecer o mundo extramental, a objetividade do ser, e dizia que isso podia ser alcançado justamente por causa Deus, que criou tudo “com número, medida e ordem”. Seus discipulos, porém, não quiseram seguir com este salto lógico do mestre, chegando no cume do idealismo em Kant, onde justamente a crítica da razão pura vai postular que não podemos conhecer as coisas tais como elas são.

 O segundo problema de Descartes é que ele criou uma nova antropologia. Ele fez um dualismo entre corpo e alma.

Desta divisão radical entre corpo (matéria) e alma (espírito), a unidade substancial do homem ficou irremediavelmente comprometida. Descartes não conseguiu dar resposta satisfatória a este dualismo criado e seus discipulos responderam por duas vias. 1) materialismo: resolvendo a questão com a morte do espírito; 2) idealismo: unificando tudo no espírito.

Diante disso, até para não incorrer em tais erros, devemos lembrar a relação que há entre corpo e alma: a alma é a forma do corpo, ou seja, alma e corpo estão substancialmente unidas (é um composto), onde a alma, principio vital, anima e governa o corpo. Não há, portanto, oposição entre alma e corpo.

Todavia, Descartes em seu intento de criar uma filosofia individualista, acabou fazendo um erro bem parecido com o que já havia feito Lutero: criando oposição onde não há.

Padre Leonel Franca encerra deste modo o capítulo:

Na cristandade medieval um ideal comum assegurava-lhe uma unidade profunda na concepção da vida e uma fonte inexaurível de energia morais. Consolidavam-se assim as bases espirituais indispensáveis ao convívio social. A ruptura protestante tentando separar Cristo da sua Igreja e proclamando a soberania do senso individual inciou a obra funesta da desgregação religiosa do Ocidente. É o aspecto negativo deste momento histórico.

Positivamente, as novas concepções filosóficas que entram na circulação tendem a separar o mundo do pensamento e o mundo da realidade e a sobreestimar, na vida psicológica, os valores efetivos em detrimento dos intelectuais. Germes de idealismo que cavam um fosso intransponível entre a inteligência e o ser; germes de subjetivismo que depois de encerrar o pensamento no círculo de uma imanência absoluta [o homem fechado em si], fechada ao conhecimento de qualquer realidade transcendente, confia a direção da vida espiritual às surpresas inverificáveis do sentimento e do instinto. Desorganização do mundo interior paralela à dissolução das estruturas sociais. Primeiras manifestações de uma dupla anarquia que irá agravando, com os séculos, as suas devastações dolorosas (p. 85).

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Augusto Pola Júnior

Augusto Pola Júnior

Vice-presidente do Instituto Santo Atanásio, seu maior interesse de estudo é psicologia (em especial a tomista) e espiritualidade. Possui especialização em Logoterapia e Análise Existencial e em Aconselhamento e Orientação Espiritual.
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